Folha de S. Paulo


Wadih Damus questiona versão da polícia do Rio sobre morte de Malhães

O presidente da Comissão Estadual da Verdade do Rio de Janeiro, Wadih Damus, fez nesta terça-feira (29) um apelo ao Ministério da Justiça para que a Polícia Federal investigue a morte do coronel reformado Paulo Malhães, assassinado semana passada no Rio.

Em audiência na Comissão de Direitos Humanos do Senado, Damus questionou a versão apresentada pela Polícia Civil do Rio de que o coronel foi morto em crime comum. "Não quero aqui lançar suspeitas pela idoneidade da Polícia Civil, mas a tendência é encarar como ocorrência policial, como aconteceu. Mas temos que ir às investigações. Não foi uma pessoa qualquer, foi alguém com essa folha de péssimos serviços prestados ao país, de macabros serviços prestados à repressão política", afirmou.

Damus disse que, se ao final das investigações a Polícia Federal confirmar a versão de latrocínio (roubo seguido de morte), a Comissão Estadual da Verdade vai acatar o resultado. Até lá, porém, disse que há um "longo caminho" para se apurar a morte do coronel.

"A morte do coronel não pode ser tratada como outra qualquer por se tratar de quem se tratava. O coronel tinha extensa folha corrida na atividade repressiva. Ele idealizou as causas da morte. Ele organizou tecnicamente, segundo ele próprio, a operacionalidade dos desaparecimentos", afirmou.

Após ouvir o depoimento de Damus, a Comissão de Direitos Humanos do Senado aprovou diligência no Estado para acompanhar as investigações sobre a morte de Malhães –com o envio de um grupo de senadores ao Rio.

Autor do pedido de diligência, o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) disse que a Comissão de Direitos Humanos não concorda com o "tratamento" dado pela Polícia Civil do Rio ao caso da morte de Malhães. "Eu lamento a forma como a Polícia Civil do Rio está tratando, de apresentar a confissão de caseiro como espécie de encerramento do caso. Não aceito que esse caso seja tratado desta forma."

Randolfe disse que houve "negligência" do Estado brasileiro em relação à principal testemunha de crimes cometidos durante o período da ditadura militar (1965-1985). "Seja qual for a razão da morte dele, foi negligência total. Por isso não podemos nos omitir mais do que outras instituições já se omitiram. Temos que acompanhar este caso."

CASEIRO

A Polícia Civil do Rio prendeu na manhã de hoje o caseiro Rogério Pires, sob suspeita de ter participado da morte do coronel. De acordo com a polícia, ele confessou o crime em depoimento.

Segundo a polícia, a Justiça expediu mandado de prisão contra Pires no plantão judiciário. De acordo com a investigação, trata-se de um caso de latrocínio (roubo seguido de morte) com a participação do funcionário do próprio militar reformado.

Malhães foi encontrado morto na semana passada, com sinais de asfixia num dos cômodos de seu sítio, em Nova Iguaçu (Baixada Fluminense). Na ação dos criminosos, a mulher do militar e o próprio caseiro foram amarrados em quartos distintos, após a invasão da casa.

O coronel reformado havia prestado, um mês antes, depoimento à Comissão da Verdade no qual reconhecia ter participado de torturas, mortes e ocultação de corpos de vítimas da ditadura militar (1964-1985). Membros de comissões da Verdade nacional e do Rio suspeitaram de "queima de arquivo".


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