Folha de S. Paulo


EUA consultaram Dilma e Cerveró antes de autorizar compra de refinaria

Documentos da diplomacia americana revelados pelo Wikileaks mostram que o governo dos EUA enviou, em 2006, um comitiva ao Brasil para se encontrar com a então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, e tratar da compra pela Petrobras da refinaria de Pasadena, no Texas.

À época do negócio, Dilma era a chefe da Casa Civil e presidia o Conselho de Administração da Petrobras, que aprovou a compra de 50% da refinaria. Intitulado "A Aquisição da Petrobras da Pasadena Refining Systems", o documento foi enviado pela embaixada americana em Brasília ao Departamento de Estado dos EUA. Nele, consta informações de encontro entre representantes americanos com Dilma e Nestor Cerveró, então diretor da área internacional da estatal brasileira.

A informação foi revelada na manhã desta terça-feira (8) pelo site do jornal "O Estado de S. Paulo".

Além de obter informações sobre o possível investimento brasileiro em território americano, os enviados dos EUA queriam levantar dados sobre as pretensões da Petrobras em outros países da América Latina. Um dos temas tratados foi a nacionalização de operações de petróleo feitas pelo presidente do Equador, Rafael Correa, que excluiu uma empresa americana.

"A missão recebeu garantias repetidas, de maneira mais proeminente durante a visita do secretário de comércio Gutierrez no dia 7 de junho com a chefe da Casa Civil do presidente Lula, Dilma Rousseff - que também atua como presidente do Conselho de Administração da Petrobras - de que a Petrobras não tem interesse em assumir os ativos da Occidental Petroleum's Equador [que perdeu o direito de explorar petróleo no país em 2006]", diz o documento.

Editoria de Arte/Folhapress

Tanto Dilma quanto Cerveró deram ao governo americano garantias de que o caso Occidental não seria um obstáculo para a aquisição da estatal brasileira da refinaria e, também, que não seria um risco à segurança nacional americana.

"Dadas as garantias credíveis, feitas em nível ministerial, o posto acredita que o caso Occidental não deve ser um obstáculo para a Petrobras para adquirir 50% da Pasadena Refining Systems (PRS)." E continua, "o posto não acredita que a aquisição da Petrobras da PRS signifique um risco à segurança nacional".

A aquisição virou alvo da Polícia Federal por que há a suspeita de que o negócio foi conduzido de maneira a causar prejuízos à estatal brasileira. Após uma disputa na Justiça, a Petrobras acabou pagando US$ 1,18 bilhões pelo total do ativo em 2012, que os belgas adquiriram por US$ 42,5 milhões em 2005.

Dilma detonou uma crise política ao afirmar que só aprovou a compra porque se baseou em "resumo técnico e juridicamente falho", que não continha cláusulas contratuais prejudiciais à Petrobras. Cerveró, que presidia a diretoria internacional da estatal, elaborou o resumo. Cerveró é apontado como o responsável pelo resumo do documento.

Na quarta-feira (2), Edson Ribeiro, advogado de Cerveró, disse que os conselheiros receberam toda a documentação com 15 dias de antecedência da reunião do conselho, que ocorreu no dia 3 de fevereiro de 2006. Nesse encontro foi discutida a compra de metade da refinaria, que pertencia ao grupo belga Astra.

Dois ex-conselheiros da Petrobras negaram ter recebido com antecedência cópia do contrato da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, contrariando a versão da defesa do ex-diretor da estatal, Nestor Cerveró.

Fábio Barbosa, presidente-executivo do Grupo Abril, e Jorge Gerdau, presidente do conselho da siderúrgica Gerdau, corroboraram a informação da presidente Dilma, de que "não receberam previamente o contrato".

Documento interno da Petrobras obtido pela Folha mostra que, na véspera da reunião, os conselheiros já tinham acesso ao acordo de acionistas. Não foi possível estabelecer se esse documento já estava disponível com mais antecedência.

Um dia antes da reunião do conselho, a diretoria da estatal deu aval à operação tendo em mãos todos os documentos. O material poderia ter sido solicitado e consultado por assistentes designados para abastecer os conselheiros com informações mais aprofundadas, afirmaram ex-profissionais ligados à administração da empresa ouvidos pela reportagem.


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