Folha de S. Paulo


Cobertura deu à Folha a imagem de 'jornal das Diretas'

"Preparem-se que a coisa pegou", disse o então repórter da Folha Carlos Brickmann ao voltar de Curitiba, onde em 12 de janeiro de 1984 40 mil pessoas pediram nas ruas eleições diretas para presidente da República.

Treze dias depois, em São Paulo, de fato "a coisa pegou". Ninguém calculou com precisão o tamanho do público no comício da praça da Sé, mas é certo que começou ali a escalada de grandes manifestações em todo o país.

O evento cristalizou também a imagem da Folha como o "jornal das Diretas". O envolvimento do jornal com as eleições para presidente, porém, começara em março de 1983, dias depois de o deputado federal Dante de Oliveira (PMDB-MT) apresentar ao Congresso sua proposta de emenda constitucional.

No dia 27 daquele mês, a Folha publicou "Por eleições diretas", editorial que endossava a tese da proposta.

Tímida e errática nos meses seguintes, a cobertura ganhou tom explícito –e pioneiro– de campanha em novembro daquele ano.

A Folha não reivindica essa intenção, seguindo a máxima do jornalista Alberto Dines em seu livro "O Papel do Jornal": "Um jornal não entra em campanha; percebe que está em campanha no meio dela".

Se é verdade que em janeiro de 1984 a Folha se percebia no meio "da coisa", os exemplares da época comprovam que ela entrou, sim, em campanha.

O divisor de águas é a edição de 17 de novembro, em cuja capa o principal título é "Sou pelas diretas, diz Figueiredo". Na página 2, editorial defende o voto direto.

Nos dez dias seguintes, que antecediam o primeiro comício pelas diretas em São Paulo, o tema foi mantido em destaque na Primeira Página e nos editoriais. No interior do jornal, uma vinheta anunciava "o fim de semana pelas diretas". A manchete do dia do comício é inequívoca: "Eleição direta é o caminho".

A manifestação no estádio do Pacaembu acabou em fracasso, mas o jornal dobrou a aposta. No dia seguinte, criticava a descoordenação do movimento e o exortava a não diluir seu objetivo central.

RISCOS INTERNOS

Publicamente, a defesa das Diretas-Já foi declarada no final de 1983, mas internamente já conquistara a maioria dos jornalistas. A equipe se envolveu ativamente na campanha, relata o então diretor de Redação, Boris Casoy.

A Folha colhia dividendos externos –não por acaso no final de 1985 conquistou a maior circulação do país–, mas alimentava um perigo interno: destruir seu principal capital editorial desde 1974, o pluralismo de opiniões.

Para evitar o risco, o jornal deixou claro em seu primeiro projeto editorial publicado, "A Folha Depois das Diretas-Já", que não seria mais porta-voz da unanimidade.

Os críticos –leitores que viam no jornal um aliado e parte da Redação– previram que a campanha teria sido o último grande momento da Folha, "apogeu de prestígio e início de decadência", relata Carlos Eduardo Lins da Silva no livro "Mil Dias", que analisa o jornal de 1984 a 1987. A previsão fracassou.


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