Folha de S. Paulo


Com ironia, Cardozo diz que lição sobre investigações veio da oposição

O ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) disse nesta quarta-feira (4) ter aprendido com a oposição que, ao receber uma denúncia, deve-se investigá-la. A declaração, em tom de ironia, foi feita durante audiência na Câmara para tratar das mais recentes acusações --que o ministro repassou à Polícia Federal-- de fraudes em licitações de trens. Os esquemas permearam três gestões tucanas em São Paulo, além de governos do PMDB e do DEM no Distrito Federal.

"Vossa excelência me ensinou que eu, quando tomar ciência de alguma denúncia, tenho que investigar", disse o ministro, em resposta aos questionamentos do líder do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio (SP). Cardozo fazia referência a um episódio de junho 2008. Na ocasião, o próprio Sampaio acusou Tarso Genro, então ministro da Justiça, de não cumprir o dever do cargo ao deixar de encaminhar para investigação uma denúncia sobre abusos no uso de cartões corporativos no governo do ex-presidente Lula.

Os documentos que estão foco da atual discórdia --entregues à PF por Carzodo-- são atribuídos a um ex-diretor da Siemens e falam de um esquema de corrupção e pagamento de propina em governos tucanos de São Paulo. O PSDB acusa o ministro de fazer uso político das acusações.

Pedro Ladeira/Folhapress
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, escuta as colocações do deputado José Aníbal (PSDB-SP), em audiência pública
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, escuta as colocações do deputado José Aníbal (PSDB-SP), em audiência pública

Os nomes de tucanos, entre eles do secretário de Energia de São Paulo, José Aníbal, são citados. Os documentos fazem parte de investigação da Polícia Federal, que é subordinada ao Ministério da Justiça.

Aníbal retomou nesta quarta o mandato de deputado federal apenas para questionar Cardozo. "Quanto tempo vai levar isso [a investigação]? Essa desgraça! Não me ameace com processo, ministro, faça. Eu disse o que eu achava do seu comportamento inadequado e continuo a dizer. Queria essa investigação limpa, transparente", afirmou Aníbal.

Em referência a uma afirmação feita no Senado por Cardozo na terça (3) que dizia que a denúncia não foi feita num "papel de pão", Aníbal provocou e pediu para que a investigação seja aberta. "Papel de pão é mais limpo. Isso aqui envelopou lama para jogar em mim e em outros", reclamou.

Como as perguntas estão sendo feitas em bloco, Cardozo ainda não respondeu Anibal.

LOBISTA

De acordo com os documentos que a Polícia Federal analisa, o lobista Arthur Teixeira, agora sob investigação, teria pago as propinas. O próprio ministro Cardozo admitiu que pode ter se encontrado com ele, há mais de dez anos.

"Quem disse que ele era um pilantra e pagava propina foi seu companheiro de partido Simão Pedro [deputado estadual do PT, que repassou o conjunto de denúncias ao ministro]. Quando o tal Arthur Teixeira se encontra com integrantes do PSDB é para pagar propina, quando se encontra com vossa excelência é para discutir mobilidade urbana", afirmou Carlos Sampaio.

Cardozo, mais uma vez, evitou polemizar. "Não importa quem apresentou, se é do PT, PSDB, se é do bem ou do mal, tenho que investigar. Engavetadores não podem mais existir no Brasil e eu não pretendo ser um deles".

Na semana passada, o ministro e a cúpula do PSDB já haviam trocaram ataques devido à investigação do cartel de trens. Os tucanos acusaram Cardozo de agir politicamente e de manipular instituições do Estado para atingir adversários.

Na ocasião, Aníbal chegou a pedir a demissão de Cardozo. Hoje, contudo, não o fez na frente do ministro.

Em resposta, o petista disse que, como de "praxe", mandou investigar as acusações que chegaram às suas mãos, diferentemente do que, segundo ele, o PSDB fazia em sua gestão.

Nesta quarta, ministro voltou a repetir que recebeu das mãos do deputado estadual Simão Pedro (PT) um conjunto de documentos "que envolviam irregularidades no metrô de São Paulo e do Distrito Federal".

Os papéis foram repassados, de acordo com Cardozo, às mãos do diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello. Em seguida foram analisados por delegados e anexados à investigação contra a Siemens em São Paulo. "Quando pedi que examinasse, pedi que se examinasse tudo, inclusive quem é autor. Acho que esse é o comportamento adequado, senão prevaricaria", afirmou Cardozo.

Repetiu ainda que a polícia cometeu um "equívoco" ao dizer que os documentos com nomes de tucanos foram repassados pelo Cade (Conselho Administrativo Econômico) e não pelo próprio ministro.

Editoria de arte/Folhapress

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