Folha de S. Paulo


Governo propõe criação de fórum de negociação para resolver conflito no MS

O Ministério da Justiça propôs nesta quinta-feira (6) a criação de um fórum de negociação para resolver o conflito entre índios e fazendeiros por demarcação de terras no Mato Grosso do Sul.

A decisão foi tomada em reunião de mais de quatro horas entre integrantes do governo e cerca de 50 líderes dos índios terenas realizada no ministério.

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Segundo o ministro José Eduardo Cardozo (Justiça), o fórum será proposto ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e ao CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público), e terá também a participação de líderes da etnia indígena, dos fazendeiros, do próprio governo e do governo do Estado.

"Será uma negociação com o intuito de chegarmos a um acordo para resolver esse conflito. No fórum iremos discutir soluções para a viabilização e o equacionamento do problema", afirmou o ministro.

O prazo para a criação do fórum será de 15 dias.

Na semana passada, durante reintegração de posse coordenada pela Polícia Federal e motivada por uma decisão judicial anterior, um índio terena morreu. A ação aconteceu na Fazenda Buriti, em Sidrolândia (MS), distante 72 km de Campo Grande.

Em novo confronto nessa semana, um segundo índio foi baleado nas costas e hospitalizado.

Cerca de 110 homens da Força Nacional viajaram para atuar na região a pedido do governador do estado, André Puccinelli (PMDB).

As investigações em relação à morte do índio serão realizadas por peritos da Polícia Federal, do governo do Estado e da Secretaria de Direitos Humanos.

REUNIÃO

Além de Cardozo, estavam presentes na reunião com os índios o ministro Gilberto Carvalho (Secretaria Geral da Presidência), o Advogado-Geral da União, Luís Inácio Adams, e o Secretario Nacional de Articulação Social da Presidência da República, Paulo Maldos.

Um documento foi assinado por Cardozo e Carvalho garantindo a criação do fórum e uma "investigação isenta" sobre a morte do índio.

O cacique terena Antonio Jorge comentou as propostas do governo ao deixar a reunião. "Não estamos 100% satisfeitos. Diria que apenas 50%, mas vamos dar um voto de [confiança]. Sairíamos satisfeitos somente se houvesse sido dito que nós teríamos a demarcação e a homologação", afirmou.

Os índios irão permanecer na fazenda Buriti durante a negociação, mas prometem não invadir mais terras na região.

Para Cardozo, "hoje a situação é de arrefecimento do clima de tensão". "Posso estar enganado, mas já há um aceno para a possibilidade de acordo".

PROPOSTA

Antes da reunião com os índios Terena, Maldos afirmou que o governo estaria disposto a pagar não só pelas benfeitorias, mas também pela terra dos fazendeiros na área reivindicada pela etnia indígena.

Segundo ele, o governo vai "apelar ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça) que ajude a formular proposta de compensação financeira aos títulos de boa fé". "Se esse caminho pacifica 90% dos casos tem que ser o caminho adotado", disse.

Maldos afirmou que "teria que identificar os tipos de título". "Se foi o estado que outorgou tem que ter um tratamento absolutamente diferente daquele invasor de terra indígena de má fé, que entrou sabendo que era indígena".

Questionado sobre o fato ao acabar a reunião, Cardozo afirmou que "todas as possibilidades jurídicas serão analisadas".

CÉTICOS

Dois irmãos do índio Oziel Gabriel, 35, morto no confronto com policiais, estavam na comitiva da etnia terena em Brasília. Eles mostraram-se céticos em relação ao inquérito aberto pela Polícia Federal sobre o caso.

"A minha expectativa é que não [seja] Polícia Federal que investigue. Ela vai amenizar a investigação. [O nosso] pedido é para que parta de outros órgãos e que realmente o culpado pague pelo crime", disse Elisur Gabriel, 43.

"Vejo a morte do meu irmão como um assassinato [feito pela] Força Policial. Ele estava apenas com arco e flecha. Tentaram calar a nossa voz, mas agora essa luta se tornou sagrada para nós", afirmou Deones Gabriel, 29. "Passei o meu primeiro aniversário sem o meu irmão na estrada a caminho da reunião".


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