Folha de S. Paulo


Cobrança de mensalidade elitiza universidades britânicas, diz pesquisador

Num editorial recente foi mencionado que a cobrança de taxas acadêmicas é comum em universidades de alguns países de primeiro mundo. Isso é verdade, mas é preciso deixar claro que essa não é necessariamente uma boa estratégia.

De 2001 para cá, tenho passado muito tempo em universidades britânicas e tenho acompanhado de perto o efeito da política de cobrança.

As universidades públicas britânicas eram gratuitas ate os anos 1990. O governo cortou verbas e forcou as instituições a cobrarem dos alunos para complementar o orçamento.

Em 2012, fizeram um corte ainda maior, que obrigou as universidades a cobrarem o triplo do que cobravam anteriormente. A consequência é que os alunos se tornaram clientes, os cursos de humanas estão fechando, professores trabalham sob uma pressão absurda e muitos estão sendo demitidos. Essa pressão é altamente prejudicial ao pensamento livre, à criatividade e ao progresso da ciência.

Joel Silva-03.jun.2014/ Folhapress
Estudantes protestam na sede da Unesp; Crise orçamentária da USP levantou debate sobre cobrança
Estudantes protestam na sede da Unesp; Crise orçamentária da USP levantou debate sobre cobrança

Muitos alunos só conseguem pagar a universidade se pedirem empréstimo a um banco. Eles se formam com uma divida enorme e demoram anos para conseguir pagá-la. Por isso só escolhem fazer cursos que aparentemente dão dinheiro, como administração, economia, direito, medicina.

O problema é que as escolhas que fazem hoje não necessariamente funcionarão daqui a quatro anos, por exemplo. Em 2019, o mercado de trabalho talvez fique saturado de economistas e os estudantes que estão ingressando hoje fiquem desempregados e endividados. O país está ficando sem gente criativa, sem artistas, pensadores, teóricos, matemáticos etc.

Assim, as universidades deixam de ser ambientes democráticos, os alunos só tem contato com a elite e ficam fora da realidade do pais. A diferença entre ricos e pobres aumenta.

Para piorar, esse processo é quase irreversível. Uma vez que as universidades começam a cobrar, fica difícil conseguir apoio do governo para retornar ao modelo gratuito.

TEOFILO DE CAMPOS é pesquisador na University of Surrey (Reino Unido)

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