Folha de S. Paulo


Há espaço no mundo para boas notícias, reflete leitora

Sou uma ciclista tardia e iniciante, mas já estou apaixonada por pedalar na ciclovia dos arredores do Parque Villa Lobos e da avenida Pedroso de Moraes, no bairro de Pinheiros, um grande presente que São Paulo nos deu.

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Sábado e domingo são os dias da minha alegria. No domingo, dia 19 de junho, passei pela experiência de um pequeno acidente, e todo acidente é uma combinação de pequenos detalhes que num único instante se somam e causam um resultado indesejado.

É possível que uma velocidade um pouco mais alta do que a ideal de um casal que me ultrapassou, somada à falta de uma buzina audível, à minha inexperiência e aos meus deliciosos devaneios mentais que me desplugaram do meu ambiente externo tenham causado uma colisão complicada entre a minha bicicleta e a do homem, o segundo a fazer a ultrapassagem.

Lá fui eu para o chão, quando senti uma pancada na lateral da cabeça que me impressionou de imediato. Antes de me mover, bastante assustada, precisava ver que respirava sem dor, que enxergava e ouvia.

Em questão de segundos eu tinha pelo menos três pessoas à minha volta: identifiquei o outro ciclista acidentado, com a canela sangrando, e a sua esposa que, delicadamente, e com enorme propriedade, foi me acalmando e orientando meus primeiros movimentos.

Mais alguns poucos minutos, uma médica neurologista que dirigia seu automóvel na Pedroso e vira a queda estacionou o carro, e, junto com seu namorado, veio pronta para uma breve anamnese e orientações. Todos compreenderam que eu parecia bem, mas foram taxativos: eu não deveria voltar para casa pedalando.

Não sei o nome de nenhuma das pessoas que lá estavam, mas não me esquecerei jamais do rosto de cada um deles, tampouco da gratidão que senti. O namorado da neurologista colocou minha bicicleta em seu bagageiro e me deixou na porta de minha casa, enquanto ela foi tomar um suco, já que o carro era pequeno para caber minha magrela, a acidentada e o casal.

Escrevo esse pequeno texto porque acredito que todos nós (assim como a mídia) precisamos nos esforçar para abrir espaços para algumas boas notícias na mente do mundo. Certamente elas acontecem aos montes. O ser humano, capaz de barbáries, indiferenças e cegueira social, também é capaz de uma grande solidariedade e comoventes atos de generosidade e preocupação a uma mera desconhecida.

Como em casa sentia dores e pressão no osso parietal (na lateral da cabeça), e um forte pinçamento de um nervo que descia do pescoço até minha escápula que me dificultava virar a cabeça, meus familiares se organizaram para me levar ao pronto-socorro.

Bem atendida no Hospital Samaritano, até que se provasse que não havia lesão mais grave, passei horas numa maca usando o colar cervical e, depois da alguns exames, saí de lá com doses cavalares de analgésicos e anti-inflamatórios e a boa sensação de estar pronta para seguir a vida.

Ao chegar em casa, por curiosidade, fui olhar meu capacete. Amassado do lado direito, com um afundamento bem na área do choque, concluí que devo comprar um novo. Embora eu me sinta levemente ridícula com ele, nunca mais deixarei de usá-lo para qualquer mínima pedalada.


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