Folha de S. Paulo


ROBERTO BRANT

Bernardo e Inhotim

Claudio Belli/Valor/Agência O Globo
Data: 25/08/2016Editoria: CulturaReporter: Marcos de Moura e SouzaLocal: INHOTIM, Minas Gerais Setor: ArtePauta: Entrevista com Bernardo Paz, idealizador de Inhotim, e com a curadora Marta MestrePersonagem: Bernardo Paz, idealizador de InhotimTags: Arte, artes, curadoria, galeria, galerias, museu, artistas Foto Claudio Belli / Valor Econômico / Agência O Globo ORG XMIT: 1428737 DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM
O empresário Bernardo Paz, criador do Instituto Inhotim, em foto de 2016

Inhotim é um acontecimento que não poderia jamais ter sido previsto. Não estava situado na ordem natural das coisas, e seu aparecimento, além de inesperado, foi uma novidade absoluta.

O Brasil nunca esteve na vanguarda da arte no mundo, e Minas Gerais não seria, por nenhum cálculo, o lugar natural para um empreendimento de arte contemporânea desta dimensão, deste alcance. Nossos próprios artistas sempre miraram o contemporâneo, mas nossa sociedade, mesmo as minorias letradas, sempre andaram devagar em relação ao gosto.

No entanto, Inhotim existe. E existe em Brumadinho, guardado entre os braços fortes das montanhas de Minas. Não foi uma iniciativa coletiva nem um sonho das elites. Foi criação e obra de um único indivíduo, que a imaginou do nada, o único lugar de onde vem as verdadeiras criações do espírito e de onde pode surgir o novo.

Hoje é uma realidade: uma exposição permanente, em campo aberto, das últimas criações da arte contemporânea internacional, ancorada em renomados artistas plásticos brasileiros como Tunga, Cildo Meireles, Miguel Rio Branco e Adriana Varejão, tendo como pano de fundo um luminoso jardim botânico mostrando a arte eterna da natureza brasileira.

A concepção, a iniciativa e o financiamento da estranha aventura foram obra de um único homem: Bernardo Paz. Aberto ao público há 11 anos, o Inhotim na verdade precisou de mais de 20 anos para ser o que é hoje.

Mobilizou artistas e curadores em todo o mundo e terminou sendo um empreendimento sem igual no mundo e de uma importância central na arte contemporânea. Quanto custou tudo isso? É muito difícil dizer!

Tendo nos últimos cinco anos participado do Conselho Administrativo do instituto, cujas contas são auditadas por auditoria de conceito internacional, tomei conhecimento de duas coisas : o acervo permanente do instituto foi adquirido com recursos exclusivos do Bernardo e de suas empresas, e a manutenção do instituto só foi possível durante todo esse tempo porque sempre mais do que 50% dos custos foram cobertos com transferências de recursos do Bernardo e de suas empresas.

Inhotim é, portanto —e nenhuma versão dos que sabem por ouvir dizer poderá provar o contrário—, produto da generosidade e não da ambição do Bernardo.

Hoje Inhotim é um patrimônio de Minas e do Brasil, um dos poucos sinais de vida inteligente que podemos exibir. Sem a força e o sonho do Bernardo, o Inhotim pode até sobreviver, mas deixará de ser uma plataforma de cultura aberta para os mais distantes horizontes, como tem sido até agora, para se tornar um museu, como outros, para conservar o que já passou.

Por isso, nesta hora de amargura e de tristes acontecimentos pessoais, é mais do que hora de resgatar o gênio do Bernardo, sua generosidade e sua grandeza. A sabedoria popular dita que ninguém é insubstituível, mas a verdade é que grandes homens não se substituem. Depois deles vem o vazio.

Há homens que cabem inteiros dentro de sua própria vida. Outros vão além, confundem-se com os fatos que viveram ou com a instituição que criaram e acalentaram. Este é o caso do Bernardo. Por isso, as flechas que lhe endereçam, além de ferir a sua carne, queimam os jardins de Inhotim e desbotam a luz dos painéis e instalações, para a alegria das almas pequenas.

Eu até tomaria emprestado uns versos de Augusto Frederico Schmidt (1906-1965) para ponderar: é tempo de prestarmos atenção em Bernardo, porque Bernardo não se repete...!

ROBERTO BRANT, ex-deputado federal (MG) e ex-ministro da Previdência (2001-2002, gestão FHC), é membro do Conselho Administrativo de Inhotim

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