Folha de S. Paulo


editorial

Meia guerra vencida

Fadel Senna - 9.jul.2017/AFP
Iraq's federal police members wave Iraq's national flag as they celebrate in the Old City of Mosul on July 9, 2017 after the government's announcement of the
Membros das forças de segurança iraquianas celebram em Mossul após vitória contra o Estado Islâmico

A notícia de que tropas do governo do Iraque subjugaram os últimos focos de resistência do Estado Islâmico no país –anunciada pelo premiê Haider al-Abadi no último sábado (9)– deve ser vista com otimismo, sem dispensar, todavia, boa dose de cautela.

O triunfo encerra um período de mais de três anos em que cerca de um terço do território iraquiano esteve sob o mando de um regime tirânico. Embora ainda haja pequenas zonas conflagradas na vizinha Síria, já se pode dizer que o califado um dia profetizado pelo líder do EI, Abu Bakr al-Baghdadi, vê seu ocaso próximo.

A batalha em solo tem sua importância, pois mina as fontes de financiamento da organização, mas pouco interfere num ponto em que os extremistas mostram inegável eficácia –a baixo custo. Trata-se da propaganda virtual, capaz de levar militantes ou "lobos solitários" a cometer atentados em qualquer lugar do mundo.

Mais do que ter conseguido avançar militarmente e dominar uma extensa área, só recuperada graças ao auxílio de uma coalizão liderada pelos Estados Unidos, o maior êxito do EI foi suplantar a Al Qaeda –da qual era um braço– no papel de principal força inspiradora do terror.

Isso fica claro quando se percebe que os envolvidos na quase totalidade dos mais recentes ataques na Europa e nos EUA tinham algum elo ou fizeram referência à facção para justificar suas ações.

O exemplo mais recente se deu na terça-feira (12), quando o bengalês Akayed Ullah tentou explodir uma bomba caseira em um terminal de ônibus em Nova York.

Há algumas semanas, na mesma cidade, o uzbeque Sayfullo Saipov matou oito pessoas usando uma caminhonete como arma. Em seu celular, a polícia encontrou cerca de 90 vídeos divulgados pelo EI.

Ambos, ressalte-se, eram residentes legais no país havia alguns anos, o que fragiliza a ideia de que é possível conter o terror fechando as fronteiras para potenciais agressores –como dá a entender o presidente americano, Donald Trump, com sua política anti-imigração.

Decerto os serviços de inteligência precisam ampliar o monitoramento de redes que recrutam jovens pela internet, um cenário bem mais intrincado que o de um combate militar em que o rival sabidamente tem menos munição.

Desafio maior será fazer com que o discurso extremista deixe de ser atraente a seu público-alvo, o que passa pela integração efetiva desses grupos à sociedade em que vivem. Nesse flanco da guerra, o fim ainda se mostra distante.

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