Desde que foi encontrada por três pescadores no rio Paraíba do Sul, em 1717, a imagem de Nossa Senhora Aparecida atraiu a fé de camadas pobres do Brasil Colônia. Não terá sido por acaso que se atribuíram a ela milagres como encher de peixes a rede de seus descobridores e libertar um escravo.
Essa ligação se reforçou ao longo do tempo, com a incorporação gradativa da cor negra à representação pública. Um fato circunstancial —a tez escura se originou do desgaste pelo tempo submerso— revestiu-se de simbologia, a evocar o princípio cristão de que todos são iguais perante Deus.
A popularidade da santa há muito desperta também a atenção da classe política, de Dom Pedro 1º, em 1822, ao governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), nesta quinta-feira (12).
De sua parte, a Igreja Católica percebeu nessa veneração uma forma de inflamar seus fiéis no país. A decisão, na década de 1950, de construir o maior santuário mariano do mundo na metade do caminho entre as duas maiores cidades do país viabilizou o acesso das multidões que visitam Aparecida (SP) todos os fins de semana.
Se não há duvidas de que a devoção permanece forte, tampouco se pode negar que os santos atraem menos fiéis. Pesquisa realizada pelo Datafolha mostra que apenas 38% dos brasileiros cultuam essas figuras sacras do catolicismo, ante 49% há uma década.
Da quase totalidade da população até pouco tempo atrás, os católicos somam atualmente 52% dos brasileiros, perdendo espaço para evangélicos (32%) —que não reconhecem santos— e aqueles que se declaram sem religião (8%).
Diante dessa fragmentação e do princípio do Estado laico, hoje não haveria condições políticas para que um presidente declarasse Aparecida padroeira do Brasil, como fez Getúlio Vargas em 1931.
O fim da hegemonia católica em nada atrapalha o amor dos fiéis a Aparecida, como se viu na festa mais recente. Para tanto, a liberdade religiosa, pilar da democracia brasileira, precisa ser defendida e praticada diariamente.