Folha de S. Paulo


MARCELO KFOURY MUINHOS

Governo deveria aumentar Imposto de Renda dos mais ricos? NÃO

SOLUÇÃO É REDUZIR GASTO PÚBLICO

É da natureza humana concordar em tese com reformas, mas ser contra quando nos atinge. Todos somos a favor do ajuste fiscal, de preferência em cima dos outros.

No entanto, pensando em um ajuste fiscal permanente, sou contra qualquer aumento de impostos, independentemente da faixa de renda ou de ser pessoa física ou jurídica. Isso seria apenas um paliativo -e rapidamente se tornaria insuficiente, sendo necessário trabalhar nas despesas públicas.

O cerne do desequilíbrio fiscal está no descalabro dos gastos públicos. Enquanto houve modo de aumentar as receitas para acompanhar essa dinâmica, a bicicleta continuou rodando. Desde 2013, porém, por razões estruturais, e a partir de 2015, por razões conjunturais, a receita começou a patinar. O Brasil perdeu a capacidade de gerar superavits estruturais, deteriorando agudamente a dívida pública.

O Brasil se tornou um país caro antes de se tornar um país rico. No ano passado, a carga tributária chegou a quase 33% do PIB, muito acima de qualquer outro país emergente e até de muitos desenvolvidos. A carga nos Estados Unidos, por exemplo, é de cerca de 20% do PIB.

Defendo, então, em um contexto de uma reforma tributária neutra, rediscutir a carga que incide sobre renda e produção.

Pode-se argumentar que a alíquota de Imposto de Renda sobre os trabalhadores nos percentis mais altos é relativamente baixa, portanto, caberia uma discussão acerca dos efeitos redistributivos de aumentar a tributação dos que ganham mais.

No entanto, a incidência de outros impostos no Brasil sobre o consumo de vários produtos é exorbitante (50% na compra de automóveis). Para o crescimento de longo prazo, seria até recomendável mudar esse modelo, incidindo mais na renda e menos no consumo/produção, mas sem aumentar a carga total.

Em termos mais pragmáticos, o que se percebe é a dificuldade do governo Michel Temer em conseguir avançar nas reformas que corrijam os gastos públicos.

A própria reforma da Previdência está espremida na agenda legislativa -parece que o poder de articulação do presidente no Congresso está se exaurindo.

A discussão da revisão da meta do deficit primário, para este ano e para o próximo, demonstra a preocupação de não cumprir o Orçamento aprovado.

A equipe econômica parece emparedada, sem condições de continuar o ajuste com o corte significativo dos gastos e de avançar em mais reformas estruturantes.

Nesse caso, um arranjo provisório pelo lado das receitas será proposto. Do contrário, a equipe econômica e o presidente ficam sujeitos a penalidades ao infringir a Lei de Responsabilidade Fiscal.

De qualquer maneira, dada a reação ao balão de ensaio de aumentar os impostos dos assalariados que ganham mais de R$ 20 mil, não vai ser uma discussão fácil num Congresso permeável a pressões corporativas e de olho na eleição de 2018.

A opção da equipe econômica deve ser por aumentar contribuições e impostos que não precisem de aprovação legislativa, como PIS/Cofins e IOF.

Enfim, na eleição do próximo ano, será inescapável debater o tamanho do Estado. Caso a escolha da sociedade não seja por seu enxugamento, todos teremos que pagar mais impostos, sendo feito, assim, um ajuste de pior qualidade, com consequências indesejadas sobre o crescimento e a distribuição da renda.

PARTICIPAÇÃO

MARCELO KFOURY MUINHOS, doutor em economia pela Universidade Cornell (EUA), é professor e coordenador do Centro Macro-Brasil da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas

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