Folha de S. Paulo


VLADIMIR KUHL TELES

É melhor para o país que Temer conclua seu mandato? NÃO

PERMANÊNCIA FRAGILIZA AS INSTITUIÇÕES

Durante a votação da Câmara dos Deputados que barrou a investigação contra Michel Temer no Supremo Tribunal Federal, muitos apoiadores do presidente justificaram seu voto com a afirmação de que "o importante é garantir a estabilidade do país".

Será verdadeiro esse argumento? Para a economia do Brasil é melhor que Temer fique no poder até o final do mandato, ainda que pairem dúvidas a respeito da licitude de sua conduta? Certamente, não.

A corrupção -e a subsequente captura do Estado brasileiro por interesses particulares- é uma causa central da inércia secular do nosso desenvolvimento. É um inimigo a ser combatido incansavelmente se almejamos um crescimento sustentável. De pouco adiantaria ganhar um ano de estabilidade preservando o presidente, já que para isso teríamos uma jurisprudência que fortalece a impunidade.

O ganhador do prêmio Nobel de economia Douglass North demonstrou que a qualidade das instituições é a base do fortalecimento econômico. Sem instituições sólidas não há eficiência dos mercados e os custos de transação aumentam, o que reduz a produtividade, o investimento e o crescimento.

Nesse sentido, a corrupção afeta a economia de muitas formas perversas. Gera uma alocação ineficiente de recursos, quando firmas que já detêm significativo poder de mercado recebem favores, aumentando sua fatia na economia e destruindo, assim, outras concorrentes.

A corrupção também eleva a burocracia, pois para que tal prática ilícita exista é necessário "criar a dificuldade para vender a facilidade". A economia, assim, fica ainda mais ineficiente.

Cria também incentivos para que os agentes econômicos deixem de se empenhar pela eficácia e passem a concentrar seus esforços em obter um capital político necessário para angariar favores e proteção.

Em outras palavras, os recursos da economia começam a ser redirecionados para atividades improdutivas. Todos esses aspectos deixam mais do que evidente que o combate à corrupção precisa ser consolidado.
Cada vez que deixamos de puni-la, fragilizamos as nossas instituições, reduzindo o crescimento de longo prazo.

Além disso, no presente caso, não está claro que a permanência de Temer irá garantir estabilidade.

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, poderá apresentar outra denúncia contra o presidente, pois já pediu a abertura de um novo inquérito.

Ou seja, a manutenção de Temer no cargo apenas prorroga a atual incerteza política e fragiliza o governo, dificultando ainda mais a aprovação das reformas de que o país tanto precisa.

O Brasil encontra-se travado em uma expectativa secular de desenvolvimento que não se realiza. A corrupção está nas bases dessa armadilha de baixo crescimento.

Sem punições duras, com vistas a criar um ambiente que desestimule essa prática, não teremos crescimento nem agora nem no futuro.

VLADIMIR KUHL TELES, doutor em economia pela Universidade Harvard (EUA), é vice-diretor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas

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