Folha de S. Paulo


Roberto Luis Troster

Apagando um incêndio com gasolina

O governo está antecipando dificuldades para cumprir a meta fiscal deste ano. A arrecadação está aquém do projetado, em razão da anemia da atividade econômica e do aperto de crédito.

Do lado da despesa, houve aumento de 16,8% na folha do funcionalismo e alta de 11,9% dos gastos com a Previdência. Dessa forma, o deficit projetado aumentou consideravelmente.

A questão agora é como fechar a conta deste ano. Nesse sentido, o governo anunciou o aumento de dois tributos, o PIS e o Cofins, sobre a gasolina e o diesel -talvez a Cide também seja elevada. A justificativa é que seria um "imposto verde" -com a gasolina mais cara, o etanol ficaria mais competitivo, com impactos positivos na produção de álcool e sequelas baixas na inflação.

Há mais aspectos que devem ser considerados. Ao aumentar o preço da gasolina, é razoável antecipar uma elevação no custo do litro do etanol e, com isso, uma transferência de renda dos setores intensos em transporte para o governo e para as empresas alcooleiras.

Um outro ponto deve ser analisado: o setor mais intenso no consumo de combustíveis é o agropecuário, que é o que mais cresce e o que está segurando o PIB. Não faz sentido, num momento em que a economia está anêmica, o governo colocar-lhe um freio.

Uma solução mais eficiente seria fixar uma alíquota única de 28% na tributação da renda fixa. A medida apresenta vantagens que devem ser consideradas. A primeira é de justiça social -enquanto o trabalho é tributado em até 27,5%, alguns itens da indústria são taxados em valores mais altos ainda e há aplicações financeiras que são isentas.

A justificativa para a desoneração de alguns instrumentos financeiros era fazer com que mais recursos fossem canalizados para os setores agrícolas e de construção.

Na prática, ocorreu uma redução no custo de captação de algumas instituições, com efeitos imperceptíveis nas concessões de crédito.

Atualmente, dependendo do prazo e do tipo de instrumento, a alíquota máxima é de 22,5%. Leia-se: a tributação favorece mais quem vive de juros do que aqueles que trabalham e produzem.

Mesmo com uma alíquota de 28%, considerando os juros reais pagos no Brasil, o rendimento líquido das aplicações continuaria a ser um dos mais altos do mundo.

Outra benefício é que, com juros líquidos mais baixos, haveria um incentivo para a migração de recursos aplicados em renda fixa para o setor não financeiro.

O incêndio deste ano não precisa ser apagado com gasolina. Para os próximos, deve-se pensar, desde agora, numa estratégia mais consistente. É paradoxal, mas o Brasil foi inovador em matéria tributária no passado, sendo o segundo país do mundo a implantar um imposto de valor adicionado.

Nesse sentido, além do remendo proposto para resolver o problema de 2017, fica a sugestão para os seguintes: a criação de um imposto de valor adicionado integrado, que substituiria o IPI, o ICMS, o ISS, o PIS, a Cofins, o IOF e Imposto de Renda de aplicações financeiras.

ROBERTO LUIS TROSTER, doutor em economia e consultor, foi economista-chefe da Febraban (Federação Brasileira de Bancos) e professor da USP

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