Folha de S. Paulo


ANDRÉ PORTELA

A reforma trabalhista vai contribuir para a recuperação da economia? SIM

BONS AVANÇOS PARA O PAÍS

A reforma trabalhista aprovada pelo Senado representa bons avanços para o país.

Ninguém nega a necessidade de políticas de proteção ao emprego. São importantes para proteger o trabalhador de ações arbitrárias do empregador, corrigir distorções geradas por informações imperfeitas sobre condições do trabalho e promover relações estáveis e duradouras capazes de estimular o investimento da firma no capital humano.

No entanto, o demônio mora nos detalhes. Se mal desenhada, a regulação acarretará consequências não desejadas.

Pode restringir o processo de criação e destruição de empregos e limitar a capacidade das firmas de explorar novas tecnologias e mercados; reduzir a capacidade de se realocar o trabalho naqueles setores ou atividades em que seu uso seria mais produtivo; induzir o surgimento de parcelas de trabalhadores não protegidos (setor informal); e criar estrutura de incentivos que permitam comportamentos oportunistas.

O dilema está em encontrar a combinação ideal entre a proteção ao trabalhador e o crescimento da produtividade. O desenho correto das regras e a estrutura de incentivos subjacentes são cruciais para o seu bom resultado.

A regulação do trabalho no Brasil há muito tem dado mostras de seus limites. Não foi capaz de estender a sua proteção ao conjunto dos trabalhadores brasileiros.

Mesmo entre a parcela protegida surgiram alguns incentivos perversos que provocam, por exemplo, a alta rotatividade do emprego. Criou-se uma estrutura institucional de alto custo de transação e de incertezas.

A reforma aprovada adapta a nossa regulação aos novos tempos, ao mesmo tempo em que reduz suas consequências não intencionais negativas.

Primeiro, ela abre a possibilidade de gerar ganhos mútuos entre as partes ao ampliar e garantir o espaço de negociação dentro de alguns parâmetros estabelecidos -prevalência do negociado sobre o legislado e do acordo coletivo sobre a convenção coletiva.

Segundo, reduz o custo de transação. Medidas como homologação facultativa da rescisão, extinção do contrato por comum acordo, conciliação extrajudicial e arbitragem para trabalhadores com salários acima de duas vezes o piso do INSS são exemplos disso.

Ademais, estabelece regras para minimizar o excessivo número de processos na Justiça do Trabalho, cuja gratuidade dos encargos é concedida apenas aos mais pobres.

Terceiro, a reforma dá maior margem de manobra para as partes se adaptarem a situações inesperadas de choques negativos, uma vez que permite ajustes de horas trabalhadas e benefícios (jornada de tempo parcial, banco de horas e compensação de jornada).

Quarto, diminui as incertezas jurídicas ao estabelecer a lei como fator preponderante na interpretação e aplicação dos direitos e definir a terceirização em qualquer atividade, a não integração de prêmios à remuneração e a responsabilidade da empresa sucessora.

Por fim, estende a proteção às novas relações de trabalho e organização produtiva. Prova disso é a regulamentação do trabalho à distância, do trabalho intermitente e da terceirização de qualquer atividade.

ANDRÉ PORTELA, doutor em economia pela Universidade Cornell (EUA), é professor de microeconometria da Fundação Getulio Vargas

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