Folha de S. Paulo


MARCO ANTONIO ZAGO

A USP está correta em adotar cotas sociais e raciais? SIM

DERRUBANDO OS MUROS

O Conselho Universitário da USP deu um passo histórico nesta semana ao aprovar a reserva de vagas para alunos de escolas públicas e para autodeclarados pretos, pardos e indígenas. A mudança passa a valer a partir do próximo ano nos cursos de graduação.

A discussão trouxe à tona o conflito entre duas visões: restringir a seleção aos mais bem colocados nos exames do vestibular ou também levar em conta o papel social da universidade.

A decisão sem precedentes revela a convergência de opinião ao redor de duas premissas. A primeira é a necessidade premente de aumentar a inclusão social, pelos seus efeitos práticos e pelo elevado simbolismo.

Igualmente importante foi a crescente convicção de que o desempenho acadêmico dos estudantes incluídos pode ser equivalente, ou mesmo melhor, ao dos selecionados apenas com base nos resultados dos exames.

As novas regras serão aplicadas de forma escalonada: no ingresso de 2018 serão reservadas 37% das vagas de cada uma de nossas unidades, progredindo até 50% das vagas por curso e turno.

Nessas porcentagens incidirá o porcentual de 37% para estudantes autodeclarados pretos, pardos ou indígenas, índice equivalente à proporção desses grupos na população de nosso Estado.

Nessa reserva são somadas as vagas dos dois processos de seleção da USP: o vestibular da Fuvest e o Sistema de Seleção Unificada (Sisu), que possuem abordagens e abrangência diferentes.

Universidade de classe internacional, a USP tem a responsabilidade de garantir uma formação de qualidade, de produzir pesquisa de ponta, promover ações de extensão e representar ferramenta de modificação social. Uma das maneiras mais eficazes de atuar nesse sentido é dar oportunidade para que jovens talentosos da escola pública sejam incorporados à vida universitária.

A decisão não comprometerá a excelência do ensino que caracteriza nossa universidade, já que, dentre os mais de 380 mil alunos que concluem o ensino médio público em São Paulo, há um enorme contingente extremamente capaz. Muitos desses alunos conquistaram sucesso em sua trajetória acadêmica.

Neste ano, a USP alcançou a marca recorde de 37% de ingressantes de escolas públicas, com 19% de pretos e pardos –percentuais que representaram, entretanto, médias gerais de toda a universidade.

Com a nova decisão, a partir do próximo ano, esse será o valor mínimo de todas as faculdades da USP, associado à garantia de inclusão de jovens pretos, pardos ou indígenas em todas elas.

Com isso, nossa instituição vai ganhar novo perfil social, étnico e cultural.

Nossos estudantes serão educados em um ambiente acadêmico que privilegia a diversidade, ao invés de ser socialmente segregado e culturalmente monótono.

O aumento da inclusão social acarretará, no entanto, acréscimo de gastos com formação e permanência estudantil –tais como moradia, transporte e alimentação–, ações nas quais a USP já investe cerca de R$ 200 milhões anuais.

Por esse motivo, será constituída comissão que apoiará a pró-reitoria de graduação na avaliação dos resultados, propondo medidas para atingir as metas estabelecidas e informar o Conselho Universitário sobre a sua sustentabilidade orçamentária.

A implantação da reserva de vagas sociais e raciais se configura como mais um marco na história da universidade, num período de transição e de mudanças. Estamos derrubando os muros da USP e a aproximando da sociedade!

MARCO ANTONIO ZAGO é professor titular da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto e reitor da Universidade de São Paulo (USP)

PARTICIPAÇÃO

Para colaborar, basta enviar e-mail para debates@grupofolha.com.br

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamentos contemporâneo.


Endereço da página:

Links no texto: