Folha de S. Paulo


Nino Oliveira Toldo

Críticas injustas à colaboração premiada

Os acordos de colaboração celebrados entre os irmãos Joesley e Wesley Batista e a Procuradoria-Geral da República (PGR), homologados pelo ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), chamaram a atenção pelos benefícios concedidos aos empresários.

Foram considerados excessivos e geraram críticas genéricas. São justas tais opiniões?

Para responder a essa questão, é fundamental lembrar que a colaboração premiada é meio de obtenção de prova nos casos que envolvem organizações criminosas.

A colaboração é reconhecida em tratados internacionais, como as convenções da ONU contra o crime transnacional e contra a corrupção. Na Brasil, está prevista em diversas leis, como as que tratam de crimes hediondos, crimes contra o sistema financeiro, lavagem de dinheiro, proteção a testemunhas e drogas.

O instituto da colaboração teve seus contornos e requisitos definidos pela Lei das Organizações Criminosas (lei n° 12.850), em vigor desde 2013. Desde então, passou a ser usado mais frequentemente.

Na Lava Jato, já ajudou a revelar o submundo da corrupção no sistema político. Segundo essa lei, o juiz pode, a pedido das partes (delegado de polícia ou Ministério Público e colaborador), conceder o perdão judicial, reduzir a pena ou substituí-la por medidas restritivas de direitos a quem colaborar efetiva e voluntariamente com a investigação.

Para que o juiz tome essa atitude, porém, é preciso que a colaboração dê algum dos resultados estipulados pela lei, como a identificação dos demais integrantes da organização criminosa, a revelação da estrutura hierárquica e divisão de tarefas do grupo, a prevenção de infrações penais, a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações praticadas ou a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada.

Para que o Ministério Público deixe de oferecer denúncia contra o colaborador, é também necessário que ele não seja o líder da organização criminosa e seja o primeiro a prestar efetiva colaboração.

O juiz não participa dessas negociações, mas poderá recusar sua homologação se a proposta não atender aos requisitos legais. Colaboração é um negócio jurídico processual e assim já decidiu o STF, no julgamento do habeas corpus 127.483. Uma vez homologado, não pode ser revisto quanto aos seus termos.

No entanto, a colaboração é condicionada. O acordo somente terá eficácia se as informações fornecidas pelo colaborador se comprovarem, e a organização criminosa for desmantelada.

Ao homologar o acordo, o juiz verifica o requisito da voluntariedade do colaborador. A análise da efetividade somente será feita ao final do processo, por ocasião da sentença ou do acórdão (no caso de competência originária).

Pode-se até discutir os limites do Ministério Público para celebrar a colaboração, mas são injustas as críticas lançadas à homologação feita pelo ministro Fachin, que apenas examinou os aspectos formais dos acordos -os quais, agora, terão sua efetividade averiguada no decorrer dos processos submetidos à apreciação do STF, em julgamento colegiado.

NINO OLIVEIRA TOLDO, doutor em direito pela USP, é desembargador do Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Foi presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe)

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