Folha de S. Paulo


ROGÉRIO CEZAR DE CERQUEIRA LEITE

Caos na ciência

O Brasil tem utilizado quase que exclusivamente chamadas públicas para estabelecer uma política em ciência e tecnologia.

Quanto ao interesse nacional, esse procedimento é obviamente melhor do que o simples recurso à demanda de pesquisadores, denominado "balcão", mas leva com frequência a investimentos desconexos, quando não intempestivos.

Para elaborar uma política de ciência e tecnologia consequente, entretanto, é preciso estribá-la em uma análise das eventuais opções e de suas consequências sociais, econômicas e acadêmicas.

Afinal, para que recursos financeiros e humanos aplicados em pesquisas e desenvolvimento sejam considerados pertinentes, é necessário justificá-los adequadamente.

Abaixo propomos algumas escolhas tanto quanto ao conteúdo como às igualmente importantes possíveis estratégias contingenciais.

As opções preferenciais para o Brasil seriam biotecnologia e biofármacos, nanotecnologias e aquecimento global. Em seguida, escolheríamos biomassa para a produção de energia e materiais substitutivos de derivados fósseis e energias alternativas.

Tecnologias digitais viriam em seguida, apesar de suas consequências limitadas para a ampliação do conhecimento.

Para finalizar, escolheríamos atividades de pesquisa em ciências básicas. Embora suas consequências econômicas e sociais esperadas sejam reduzidas, permanecem essenciais para o corpo geral do conhecimento e seus efeitos civilizadores.

Tão importante quanto a seleção das áreas é a escolha de contingências propícias à pesquisa.

Uma política para ciência e tecnologia não pode deixar de considerar a maior eficiência alcançada pela concentração de investimentos e de recursos humanos em locais e em disciplinas específicas.

Também é importante reconhecer os ganhos proporcionados por trocas internacionais. Essencial é ainda encontrar novas formas de gestão, tais como as OSs (organizações sociais).

As escolhas aqui incluídas são deste escriba. Outros pesquisadores ou gestores proporão, por certo, alternativas a elas.

Torna-se, portanto, necessário eleger uma comissão de "notório saber" para elaborar tais escolhas, que contribuiriam para uma política de Estado para ciência e tecnologia.

Uma avaliação como esta nortearia o governo federal e os estaduais em suas escolhas. Atualmente vemos diversos agentes -tais como o BNDES, o CNPq, a Capes, a Finep e agências estaduais- fazendo cada um a sua própria política para o setor.

O mesmo ocorre nos ministérios -Saúde, Agricultura, Minas e Energia, além do de Ciência e Tecnologia.

Para evitar desencontros, redundâncias e disparates, os EUA têm um organismo da Presidência que estabelece prioridades para o setor.

Poderíamos pensar que o Conselho de Ciência e Tecnologia cumpriria esse papel, e talvez tenha sido criado com esse propósito, mas, não sendo um organismo permanente, acaba se tornando plataforma para a defesa de interesses específicos de grupos.

ROGÉRIO CEZAR DE CERQUEIRA LEITE, físico, é professor emérito da Unicamp e membro do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia e do Conselho Editorial da Folha

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