Folha de S. Paulo


SÉRGIO RENAULT

Jaulas

Em recente decisão, o Supremo Tribunal Federal determinou que o Estado deve indenizar preso que tenha sido mantido em condições degradantes. Tomada por unanimidade dos ministros em caso específico, a decisão tem caráter de repercussão geral, ou seja, deve ser seguida por outros tribunais aos quais seja levada questão análoga.

Trata-se de medida de inegável importância, alcance e oportunidade. O sistema prisional brasileiro já nos envergonha há muito tempo. Lotados e em péssimas condições, os presídios parecem ter chegado a um ponto inaceitável.

No país em que impera a sensação de impunidade, prende-se em demasia e cuida-se mal dos presos. Não se faz justiça tratando alguém como se a condenação fosse pela perda da dignidade. O Estado é responsável pela custódia dos detentos e por sua manutenção em condições compatíveis com a dignidade humana.

A sensação de impunidade há de se dissipar com julgamentos criteriosos e mais céleres, não com maus tratos. Não é essa a resposta que o Estado de direito deve à sociedade, ávida por justiça que decorra do cumprimento das leis.

Ao Judiciário cumpre julgar e julgar bem. Ao Poder Executivo cabe cumprir a sua responsabilidade de tratar como gente quem, por qualquer razão, esteja sob a sua guarda. Fora disso, falta civilidade e sobra a barbárie.

A decisão do Supremo obriga o Estado a indenizar aquele que tratou mal. Resta-lhe a opção de implementar políticas públicas com o objetivo de melhorar as condições dos presos. O Conselho Nacional de Justiça, também acertadamente, definiu a questão carcerária como uma de suas prioridades de ação.

Muito há que ser feito também pelo Legislativo, aperfeiçoando a legislação penal de modo que os limitados espaços dos presídios sejam destinados aos que oferecem risco à sociedade e possam lá ser preparados para o retorno ao convívio social.

Decisões inovadoras, políticas públicas consistentes e leis adequadas ao nosso tempo indicam o que se pode esperar dos três Poderes para o enfrentamento da situação dos presídios. Tudo parece pouco diante do enorme desafio. A sociedade precisa estar consciente, participar do debate e assumir a sua responsabilidade.

Neste ano, assim como em suas 13 edições anteriores, o Instituto Innovare irá premiar práticas desenvolvidas por juízes, promotores, advogados, defensores públicos e cidadãos de categorias profissionais fora da área jurídica que tragam melhoria para o funcionamento de nossa Justiça.

A novidade desta edição será o destaque dado a iniciativas que se refiram ao sistema prisional. O prêmio -ou, no dizer de Norberto Bobbio, a sanção premial- é a forma de distinguir alguém que tenha uma experiência relevante nesse tema tão complexo.

É responsabilidade da sociedade buscar caminhos para eliminar a sensação de que estamos prestes a romper a já tênue barreira entre a civilização e a barbárie.

SÉRGIO RENAULT é advogado e diretor presidente do Instituto Innovare

PARTICIPAÇÃO

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