Folha de S. Paulo


Luís Fernando Guedes Pinto e Luís Carlos Guedes Pinto

Contradições da agricultura brasileira

A agricultura brasileira cresceu e se transformou nas últimas décadas, alcançando importância global. Passamos de importador de alimentos para um dos maiores exportadores de commodities do mundo devido ao aumento da área cultivada e, principalmente, a um grande aumento de produtividade.

De 1991 a 2015, a produtividade de grãos aumentou de 1.528 para 3.593 kg/ha, enquanto o valor das exportações cresceu mais de sete vezes. Já o preço da cesta básica de alimentos diminuiu 40% entre 1970 e 2010.

As políticas públicas, o empreendedorismo dos produtores e os investimentos das cadeias produtivas determinaram um ciclo de modernização da agricultura no qual a sua enorme contribuição para a economia está associada a impactos ambientais e sociais.

A maior parte da riqueza gerada pelo setor passou do campo para as etapas antes e após os cultivos. A terra, a produção e a renda são concentradas em um grupo relativamente pequeno de grandes produtores, enquanto a pobreza permanece para muitos pequenos agricultores.

Menos de 1% dos mais de 5 milhões de estabelecimentos rurais produzem 51% da renda; já 66% dos agricultores têm renda inferior a um salário mínimo.

As condições de trabalho permanecem precárias para muitos trabalhadores assalariados e a violência no campo, na disputa pela terra, ainda não foi superada.

As hegemônicas monoculturas e a revolução verde contrariam o princípio ecológico da diversidade nos trópicos e exigem cada vez mais energia. Assim, passamos a ser o maior consumidor mundial de agrotóxicos, além de um dos países líderes no desmatamento e na emissão de gases de efeito estufa.

Os indicadores de resultado do setor não acompanharam a sua dinamização. Norteiam aumentos de produção e produtividade, resultando em políticas que somente incorporam as novas agendas de equidade e sustentabilidade de maneira marginal, embora elas tenham migrado para o centro da sociedade.

Há um esforço para transitarmos do predatório e precário para o responsável e sustentável, mas não sabemos o tamanho de cada situação. É urgente a realização do censo agropecuário por diversas vezes adiado.

Dessa forma, a trajetória do setor e suas políticas públicas precisam ser revistas para que a agricultura possa alcançar o seu potencial de contribuir para a geração de riqueza, conservação ambiental e equidade.

O crédito, a pesquisa e a assistência técnica devem ser atualizados e combinados com instrumentos que garantam a renda do produtor, induzam mudanças tecnológicas, fortaleçam a gestão da propriedade e resultem em uma nova geração de sistemas de produção tropical eficientes, estáveis e resilientes.

Assim, poderão fornecer serviços ambientais para uma agricultura realmente sustentável.

LUÍS FERNANDO GUEDES PINTO, engenheiro agrônomo, é gerente do Imaflora (Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola). É membro da Rede Folha de Empreendedores Sociais

LUÍS CARLOS GUEDES PINTO, engenheiro agrônomo, é professor titular aposentado do Instituto de Economia da Unicamp. Foi ministro de Agricultura (governo Lula)

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