Folha de S. Paulo


Paulo Feldmann

Precisamos falar de privatização

No momento em que voltava ao mundo capitalista, após o abandono do regime comunista em 1991, a Rússia (ex-União Soviética) lançou um enorme programa de privatização das antigas estatais.

Foi um gigantesco fracasso para os russos, que se viram obrigados a conviver com uma recessão de quase uma década.

A China, nessa mesma época, ao observar os erros cometidos pelos seus antigos aliados comunistas, resolveu também lançar um programa de privatização, mas em formato diferente. As estatais gigantescas foram divididas em várias partes e só então vendidas. A medida forçou a competição entre elas e garantiu o sucesso do modelo chinês.

Ou seja, há formas e formas de se conduzir processos de privatização. No Brasil, é evidente que um programa bem elaborado poderia atenuar a dramática situação da economia. Por outro lado, também é óbvio que desencadearia muita discussão.

Estima-se que apenas no setor elétrico seja possível conseguir mais de R$ 40 bilhões com a venda de empresas como Furnas, Eletronorte, Chesf e outras.

Com esse valor, não apenas eliminaríamos a quarta parte do deficit fiscal anunciado recentemente pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, como também tornaríamos essas empresas muito mais eficientes e produtivas.

O que não se pode é repetir os mesmos erros do final dos anos 1990, quando governos estaduais e também o federal privatizaram inúmeras empresas elétricas, sem qualquer benefício para a população.

De nada adianta passar um serviço público para o setor privado se o novo dono não tiver a obrigação de prestar contas à sociedade e aos consumidores.

O papel da agência reguladora do setor elétrico, Aneel, precisa ser revisto. Uma fiscalização que de fato defenda os interesses dos consumidores é fundamental.

Isso é válido para todos os setores, ou seja, as privatizações trarão mais seriedade por parte das agências reguladoras e o abandono da prática de indicações políticas.

Hoje, em boa parte das agências, a diretoria é indicada por partidos políticos, em conjunto com as próprias empresas do respectivo setor, que, em tese, deveriam ser reguladas por essas mesmas agências. É o típico caso da raposa tomando conta do galinheiro.

Além do setor elétrico, o governo deveria sair da operação de inúmeras outras empresas estatais. Duas delas, especialmente, darão contribuição de peso às finanças do país se privatizadas: Correios e Infraero.

A Petrobras não deveria ser incluída nesse programa, pois geraria uma discussão interminável que ameaçaria emperrar toda a ação. O mesmo ocorre com Banco do Brasil e Caixa Econômica. Essas privatizações talvez sejam possíveis no futuro.

Para sermos bem-sucedidos, precisamos nos despojar de ideologias e bandeiras. Com isenção de ânimo e sem cor política, o que se faz necessário é pensar no real interesse da sociedade brasileira.

PAULO FELDMANN, é professor associado da Faculdade de Economia e Administração da USP. Foi presidente da Eletropaulo (governo Mario Covas)

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