Folha de S. Paulo


EDITORIAL

Alento industrial

Se há sinais de que o pior da recessão parece estar chegando ao fim, os mais recentes resultados da indústria prenunciam também um caminho longo e incerto para a recuperação da economia do país.

Conforme o IBGE, a produção total do setor apresentou crescimento de 0,6% no período de três meses encerrado em maio, na comparação com o trimestre fevereiro-abril. Interrompeu-se, com isso, uma queda vertiginosa iniciada em outubro de 2014.

Em um cenário de terra arrasada, o dado suscita um alento incipiente, mas importante. A reforçá-lo, as sondagens feitas entre os empresários mostram aumento contínuo da confiança —um indicativo da propensão a investir e contratar— de fevereiro a junho.

Particularmente promissor tem sido o desempenho dos bens de capital, que incluem veículos, máquinas e outros equipamentos destinados a ampliar a capacidade de produção de outros artigos. Em expansão por cinco meses consecutivos, essa categoria industrial encoraja prognósticos de uma retomada econômica mais ampla.

Convém, entretanto, colocar cifras e esperanças em perspectiva. As mazelas da indústria precedem a profunda recessão que no ano passado irradiou-se pelas demais atividades. O Produto Interno Bruto do setor alterna contrações e altas espasmódicas desde 2012; hoje, assemelha-se ao de 2008, antes do agravamento da crise global.

Partindo de uma base tão deprimida, alguma reação seria previsível. Ainda assim, os números permanecem modestos —basta dizer que o aumento da produção de abril para maio foi zero.

Detalhado, o saldo nulo demonstra com eloquência os descompassos da recuperação. Dos 24 ramos pesquisados, 12 tiveram crescimento, um ficou estagnado e 11 encolheram. Se comparada à de maio do ano passado, a produção geral foi 7,8% menor.

Tudo considerado, parece inegável que uma melhora geral dos humores empresariais começa a estancar a derrocada industrial. Tende a contribuir para o alívio, decerto, a credibilidade da equipe econômica nomeada pelo presidente interino, Michel Temer (PMDB), e a aceitação de seu programa de ajuste do Orçamento federal.

Mas, expectativas à parte, restam intocados os empecilhos estruturais que atravancam o setor. Juros bancários escorchantes, sistema tributário caótico e legislação trabalhista arcaica, para mencionar apenas os exemplos principais, demandarão reformas mais sofisticadas que o mero —e já difícil— controle dos gastos públicos.

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