Folha de S. Paulo


Manuel de la Cámara Hermoso

Democracia espanhola não está em risco

A Folha publicou, no último domingo (26/6), o artigo "Democracia em risco na Espanha", escrito por Raül Romeva, autodeclarado ministro das Relações Exteriores do governo da Catalunha.

Ao contrário do que afirma o texto, a Espanha é uma democracia moderna e madura, na qual os direitos e liberdades fundamentais de todos os cidadãos são respeitados.
Somos membros da ONU, bem como da União Europeia e do Conselho da Europa. Temos adotado e aplicamos tanto a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia como a Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais.

A Espanha é um Estado de Direito em cujo vértice está a Constituição de 1978, aprovada por uma grande maioria de cidadãos espanhóis, incluindo o 90,4% dos catalães.

Essa Constituição permitiu que a Catalunha, uma das regiões mais ricas e prósperas do país, desfrutasse de um grau de autonomia política, administrativa, econômica e cultural muito amplo, com um governo autônomo, a Generalitat de Catalunha, do qual o sr. Romeva é conselheiro (cargo equivalente a secretário estadual no Brasil).

A Constituição espanhola estabelece "a soberania nacional do povo espanhol, do qual emanam todos os poderes do Estado" e "a indissolúvel unidade da nação espanhola, pátria comum e indivisível de todos os espanhóis". Por tanto, nossa Constituição não reconhece o direito de secessão, como também não o faz a Constituição brasileira de 1988.

O princípio da integridade territorial dos Estados é um dos pilares da Carta da ONU. O Tratado da União Europeia estabelece a obrigação de instituições do bloco garantirem a integridade territorial de seus Estados membros. O direito de autodeterminação só se reconhece no direito internacional para aqueles povos sujeitos à dominação colonial ou a violações em massa de direitos humanos.

No dia 9 de novembro 2015, o Parlamento de Catalunha aprovou uma resolução que declarava o início de um processo de separação na Espanha. O Tribunal Constitucional a declarou nula e lembrou que não há legitimidade democrática fora da lei.

No pleito do ano passado na Catalunha, 52,2% dos eleitores votaram em forças políticas catalãs que não defendiam a secessão. Não existe, por tanto, uma maioria que legitime esse processo.

O futuro da Catalunha está dentro da Espanha e da União Europeia, nas quais os catalães poderão seguir com prosperidade e bem-estar.

O governo central está disposto a seguir dialogando com as autoridades da região, mas sempre dentro da legalidade vigente. Em todo caso, o Tribunal Constitucional lembrou que existem na própria Constituição procedimentos estabelecidos para mudá-la, mas não é possível fazê-lo de forma unilateral.

Em síntese, a democracia não está em risco na Espanha, como ficou demonstrado nas eleições gerais do dia 26. O que pode pôr em risco o sistema democrático é pretender romper de forma unilateral e ilegal a unidade do país, semeando discórdia e confronto entre os cidadãos.

*MANUEL DE LA CÁMARA HERMOSO * é embaixador da Espanha no Brasil

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