Folha de S. Paulo


editorial

Coerção na USP

Estudantes e docentes da área de humanas constituíram um dos alvos preferenciais da repressão na ditadura militar no Brasil (1964-1985). O exercício do pensamento crítico, ainda mais se incentivado pelos nomes preponderantes no paradigma intelectual da época -o da herança marxista-, era condenado pelos poderes dominantes.

Será exagerado qualquer paralelo entre aquela situação e o clima de liberdade que hoje existe na mais importante universidade do país.

As óbvias diferenças não deixam de enfatizar, contudo, o inédito e inadmissível surgimento de novas formas de coação e violência em setores daquela instituição.

Noticia-se que, por causa de piquetes intimidatórios organizados por uma minúscula minoria, professores da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) e da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP têm optado por ministrar aulas e realizar provas por meio da internet.

Atividades acadêmicas, como encontros de pós-graduação e colóquios marcados com antecedência, são conduzidas em locais alternativos e discretos, de modo a não serem interrompidos pelos grevistas.

Trata-se, na prática, de uma volta à clandestinidade, situação que só se via numa época em que alunos e professores estavam à mercê de espiões e policiais da ditadura.

Assembleias repetitivas, prolongadas artificialmente por horas, reúnem uma porcentagem mínima dos estudantes para decidir aquilo que já se decidira nos comitês de militantes de extrema-esquerda: greve, greve sempre, greve anual, greve semestral, greve permanente.

Seguem-se "cadeiraços" -barrando-se fisicamente o acesso às salas de aula-, ocupações, lances de vandalismo, atos de intimidação.

O clima é de medo e violência, diz Sérgio Adorno, diretor da FFLCH. A ocupação se prolonga desde o dia 12 de maio.

A greve de uma fatia pequena de estudantes e funcionários apresenta uma lista de reivindicações absolutamente irrealizáveis num quadro em que decresceu drasticamente a arrecadação de impostos pelo governo estadual. Fundada numa mentalidade extremista e antidemocrática, segue um rumo conhecido: o da ameaça, da violência e da opressão.

editoriais@uol.com.br


Endereço da página:

Links no texto: