Folha de S. Paulo


Ronaldo Mota

Copacabana, prenúncio Olímpico

Copacabana, principal destino turístico do Brasil, é provavelmente uma das praias mais conhecidas do planeta. Mesmo assim, ela, soberanamente, não perde sua austeridade, ou melhor, singelamente, se move ao ritmo das ondas, que sabem se deixar serem clicadas sem perder a graça ou a naturalidade.

Permanentemente se transforma, sem deixar de ser ela mesma. Um dia amanheceu sem a boate Help, no outro acordou repleta de stand-ups, bem como aguarda um Museu de Imagem e Som que se alonga no tempo.

São mudanças que se anunciam e se completam incessantemente. Copacabana parece, pacientemente, suportar suas transições, certa de não perder nunca sua integridade mutante.

Copa um dia foi colônia de pescadores e o Posto 6 (que, curiosamente, não existe enquanto Posto) nos lembra que permanece sendo. Na dúvida, um peixe fresco comprado no local, ainda hoje, nos comprova em definitivo tudo o que foi um dia.

As princesas que lhe seguem, Arpoador, Ipanema e Leblon, não lhe fazem sombra porque simplesmente com ela não competem. Não por não serem melhores, em alguns aspectos talvez o sejam, mas porque às princesas sábias não cabe lutar contra a rainha, especialmente se a sabem imortal.

Aquilo que gerou, o fez por assim ser. Os estilos musicais, a exemplo da Bossa Nova, refletiam, de alguma forma, a necessidade de tocar e cantar baixinho sem o que os vizinhos de Copacabana (e também de Ipanema, justiça se faça) reclamassem. Todos, sem exceção, movimentos culturais do país tiveram aqui seu especial espaço de expressão, criação e repercussão.

As festas de Réveillon que abrem o ano em suas praias se estendem, de alguma forma, por todos os dias, a cada novo raiar de sol, quando tudo parece recomeçar neste Brasil. Ainda que tenhamos que conviver muitas vezes com as sujeiras, os maus tratos e algumas indesejáveis, inaceitáveis e deslocadas violências.

Ela, que renasce todos os dias ao alvorecer e que não vai dormir ao anoitecer, sabe fazer jus a todas as suas origens denominativas. Uns dizem que Copacabana teria origem no idioma quíchua, falado no Império Inca, significando "lugar luminoso" ou "mirante do azul".

Há quem diga que a origem seria da língua aimará, falada na Bolívia, cuja tradução seria "vista do lago".

Por sinal, há naquele país um lugar de mesmo nome no Lago Titicaca, que consta ter sediado cultos Incas dedicados a uma divindade Kopakawana, que protegia o casamento e a fertilidade das mulheres.

Se hoje Copacabana luta contra as intempéries das crises, sejam elas a nacional, a estadual, da indústria naval ou da indústria de óleo e gás, ela se lembra bem que tem enfrentado há quase um século o fechamento de cassinos, o movimento tenentista, as ditaduras e outras tantas intempéries.

Há mais de meio século, o fim dos cassinos lhe parecia ser um golpe definitivo e que findou não sendo, bem como a crise atual também não terá esta competência de abalar sua beleza e vitalidade.

Ela se refaz, como a beleza das rainhas austeras e eternas, sabendo se expressar pelas artes, pela vocação democrática e pela tolerância, em especial no respeito aos menos jovens.

Mais do que resistir, à sua maneira, Copacabana é um pouco a cara e a essência do Brasil, refletindo seus momentos de prosperidade e suas contradições.

Neste momento, em que o país procura e encontrará seus caminhos de um desenvolvimento sustentável, que ela saiba refletir de forma positiva as novas expectativas e ajude a construir, com a sabedoria de uma rainha experiente, uma memorável Olimpíada que, por certo, promoveremos.

RONALDO MOTA é reitor da Universidade Estácio de Sá

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