Folha de S. Paulo


editorial

Estado de dívida

O presidente interino, Michel Temer (PMDB), parece decidido a reconhecer e pagar débitos políticos ou financeiros do governo.

Trouxe à luz despesas federais obscuras e projetou de modo pouco claro um deficit maior, a fim de acomodar outras surpresas. Aceitou sem mais o reajuste do funcionalismo negociado pela presidente afastada, Dilma Rousseff (PT). Agora, indica que deve exigir menos contrapartidas na renegociação da dívida dos Estados com a União.

Supõe-se que Temer queira, de uma parte, limpar o passado recente de manipulação do balanço do governo. De outra, aproveita a deterioração geral das finanças públicas para colocar nessa conta a despesa com a acumulação de capital político.

Gasta mais no intuito de manter a paz com o Judiciário, não suscitar revoltas no funcionalismo e agradar a governadores e suas bancadas estaduais. A ideia seria limpar o terreno e acumular forças com vistas à votação de reformas importantes para a economia.

O excesso de concessões, todavia, pode inviabilizar a empreitada, como nas negociações estaduais.

As finanças dos Estados estão em situação difícil ou até calamitosa, como no Rio de Janeiro, no Rio Grande do Sul e em Minas Gerais.

Desde o governo Dilma, pretende-se reduzir temporariamente o pagamento de débitos estaduais com a União em troca de controles de gastos com salários, aposentadorias e pensões e de um teto para outras despesas.

Os Estados querem uma moratória de dois anos. A contenção de gastos previdenciários ficou para outra negociação. Ainda não está claro como será o limite para despesas com folha. Os governos fluminense, gaúcho e mineiro desceram a tal penúria que precisarão ainda de acertos especiais.

Quanto mais Temer conceder, pior ficará a situação da União e menos crível será o ajuste fiscal.

As concessões da União devem de ser trocadas por um controle duro e duradouro, tal como aquele firmado no final dos anos 1990 —e relaxado a partir de 2012, com incentivo do governo Dilma. A União autorizou endividamento excessivo; Estados aumentaram despesas permanentes e com subsídios e isenções fiscais.

Lamentavelmente, o auxílio tornou-se inevitável, pois serviços essenciais estão ameaçados. Tal descalabro não pode contaminar ainda mais a também avariada administração federal, o custo das dívidas públicas e, assim, as perspectivas de reduzir juros e reerguer a confiança econômica.

Os Estados terão de apresentar um plano de redução de despesas no mínimo de proporção equivalente ao que se planeja no governo federal. A complacência prejudicará o país inteiro.

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