Folha de S. Paulo


editorial

Na carona do Uber

É bom o projeto encampado pelo prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), para regulamentar o uso de aplicativos como o Uber na cidade. E pode ficar ainda melhor após o processo de consulta pública a que foi submetido.

Não há dúvida quanto à necessidade de disciplinar a matéria. Vive-se hoje no pior dos mundos. Motoristas associados à megaempresa Uber exercem uma atividade profissional, aproveitam-se da malha viária, contribuem para piorar o trânsito e, como estão na clandestinidade, não pagam nenhum tipo de tributo por isso –e deles a prefeitura nada pode exigir.

Taxistas, que arcam no mínimo com os custos de um alvará e têm obrigações para com o poder público, entendem que a Uber faz concorrência desleal, tendo alguns deles chegado a intimidar e agredir seus choferes e passageiros.

Como não há segurança jurídica, potenciais concorrentes do aplicativo de origem norte-americana preferem nem correr o risco de disputar mercado, facilitando a formação de um monopólio.

A proposta da prefeitura ataca todos esses problemas.

A ideia é estimular a criação de empresas semelhantes à Uber –as Operadoras de Transporte Credenciadas (OTCs)–, que serão responsáveis por arregimentar motoristas e garantir certo padrão de segurança, conforto etc. Elas também terão a obrigação de monitorar as corridas, emitir recibos eletrônicos para os usuários e contratar um seguro para o caso de acidentes.

O pagamento de tributos se dará por meio da compra de créditos que permitirão aos carros vinculados às OTCs rodar um certo número de quilômetros.

A venda dos créditos pela prefeitura ocorrerá semanalmente, e as empresas terão dois meses para utilizá-los. O preço, que ainda não foi definido, poderá variar conforme necessidades de regulação.

As inovações não acabam nesses aspectos. Corridas realizadas fora dos horários de pico ou em zonas periféricas custarão menos créditos. Veículos adaptados para deficientes também terão um bônus na utilização dos quilômetros.

Imagina-se que, com tal estímulo, o próprio mercado se encarregará de cobrir áreas hoje esquecidas.

Há, no entanto, algumas extravagâncias. Não faz sentido, por exemplo, a exigência de que 15% dos créditos sejam utilizados em corridas com motoristas mulheres. Se a prefeitura acha mesmo que é o caso de fazer políticas de gênero na praça, deveria ter insistido na fórmula do desconto, e não desviado para a reserva de mercado.

Táxis ainda conservarão algumas prerrogativas exclusivas, como o direito de apanhar passageiros nas ruas (e não apenas pelo aplicativo), e continuarão a ser tributados pelo município apenas na compra e na renovação do alvará.

A questão da concorrência predatória, por sua vez, em tese estará superada. A cobrança de créditos equalizará os custos, e a cidade receberá da Uber algo pelo uso intensivo de seu espaço viário.

A competição entre os táxis e as várias OTCs tende a melhorar a qualidade dos serviços prestados aos usuários e pode até mesmo levar a uma redução no preço.

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