Folha de S. Paulo


Marcus Vicente

O futebol brasileiro vai mudar

A derrota para a Alemanha na semifinal da Copa de 2014 expôs ao mundo o perigoso estágio de paralisia, letargia e atraso do futebol brasileiro. Nos impôs a busca urgente de caminhos que devolvam à nossa seleção a primazia da genialidade e a exclusividade da arte ao jogar o mais belo e completo dos esportes. Afinal, futebol é arte, é gênio e é sinônimo de Brasil.

Não se troca governo, não se exorciza os fantasmas do esporte nem se conserta as mazelas de gestões infelizes atropelando leis e ritos. Agir assim é ilegal e ilegítimo, tanto na política quanto no futebol. Fora das regras, tudo é jogo sujo.

O futebol brasileiro mudará a partir da base, representada por centenas de ligas amadoras que sustentam competições envolventes, pelos clubes e pelas federações estaduais. Modernizaremos a gestão da CBF (Confederação Brasileira de Futebol) em quatro eixos.

O primeiro é intensificar a capacitação de treinadores, preparadores físicos, supervisores e dirigentes de clubes e federações, processo que já iniciamos.

Em segundo lugar, priorizar a capacitação e o treinamento do quadro de árbitros e assistentes, seguindo com rigor as normas da Fifa.

O terceiro eixo é criar os campeonatos brasileiros sub-15 e sub-17 e o Brasileiro sub-20 de seleções estaduais. Isso assegura as "certidões de nascimento" dos atletas na base e fortalece ligas amadoras, clubes e federações.

E em quarto lugar, internacionalizar, de fato, o futebol brasileiro. Transformar nossos torneios em produtos atrativos para o mercado internacional dará nova fonte de recursos para os clubes.

A final da Major League Soccer (MLS), a principal liga de futebol dos EUA, foi transmitida para cem países. Há quatro anos a MLS pagava a quem desejasse transmitir seus jogos. Em 2016 as transmissões da liga americana renderão US$ 1 bilhão –algo em torno de R$ 3,9 bilhões. Já nossos clubes penam para fechar suas contas, honrar contratos, investir na base e rolar dívidas.

Ter clubes fortes, com melhores elencos, fortalece as federações e atrai público. Vender as competições brasileiras para o exterior gerará novos recursos que terão de ser revertidos integralmente para os clubes que disputam os campeonatos de cada série.

Bem gerido, o futebol é um grande e lucrativo negócio. Nos EUA, os empreendimentos que orbitam em torno dele representam 3,5% do Produto Interno Bruto. Aqui, o futebol não representa sequer 0,25% do PIB. Ainda assim, temos cerca de 300 mil pessoas envolvidas diretamente com ele. O peso de nossa atividade na geração de riquezas é ínfimo ante seu potencial.

Profissionalizaremos o espetáculo dentro e fora de campo. Não é possível fazer isso sem restaurar a força e o prestígio dos clubes, sem investir na base e sem fortalecer as nossas federações.

Sem olhar para os adolescentes que batem nas portas dos clubes aos 13 anos, sem lhes dar a "certidão de nascimento" para o mundo do futebol já ali, sem federá-los aos 16 anos, seguiremos assistindo ao êxodo de talentos para centros em que são tratados com mais profissionalismo e onde os contratos são mais rentáveis.

O tripé transparência, gestão e resultados está em implantação na CBF e será a pedra de toque do novo futebol brasileiro. Faremos isso respeitando os limites que a interinidade me impõe.

Mergulhei de cabeça no planejamento, nos problemas, nas contas e nos contratos do futebol brasileiro. Críticas virão e serão ouvidas, porém não dialogaremos com preconceitos nem com interlocutores que defendam a quebra de princípios legais que regem a vida associativa.

Iremos à base buscar o sopro de genialidade e de renovação que nos trarão a tão sonhada sexta estrela, mudando de vez o perfil do futebol brasileiro.
Queremos fazer do Brasil, novamente, uma constelação do esporte no mundo.

MARCUS VICENTE, 61, é presidente interino da CBF - Confederação Brasileira de Futebol e deputado federal licenciado (PP-ES)

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