Folha de S. Paulo


Fausto Pinato

Em defesa da transparência

O Estado democrático de Direito é fundado na independência, na autonomia e no equilíbrio dos três Poderes da República: o Executivo, o Legislativo e o Judiciário.

Contudo, durante a maior parte da história política do Brasil, vivemos sob o jugo discricionário de um poder, o Executivo, que ditava leis a torto e a direito, impondo-se sobre os demais. Tal característica, que se consolidou durante o regime militar, se manteve mesmo depois da redemocratização do país.

Felizmente, depois de grandes manifestações populares contra a corrupção, em 2013 e 2015, e da atual crise política sem precedentes, os três Poderes estão definindo o espaço que lhes cabe em uma verdadeira democracia.

Com isso, teremos condições de começar a enterrar a velha política do fisiologismo, da troca de favores e do voto de cabresto. Contudo, essa autonomia, independência e equilíbrio dos Poderes, para ser efetiva, deve se estender necessariamente às comissões internas do Congresso, seja na Câmara dos Deputados, seja no Senado Federal.

Hoje o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara está no meio de um furacão: o processo por quebra de decoro parlamentar contra o deputado federal Eduardo Cunha, presidente da Casa, solicitado por parlamentares da Rede e do PSOL.

Trata-se de um fato inédito, mas também de um desafio: nos colocarmos à altura dos novos tempos, mostrando total independência e transparência, como exige e merece a sociedade.

Como relator desse processo, considerei que há indícios e documentos suficientes, anexados aos autos, para se admitir a abertura de um processo contra o deputado Eduardo Cunha. Como afirmei em meu relatório, o arquivamento da representação seria extremamente temerário e passaria à sociedade a impressão de que o Congresso Nacional não atua com espírito público de transparência.

A defesa de Cunha pediu meu afastamento da relatoria alegando que antecipei meu parecer antes de ouvi-la. O advogado Marcelo Nobre inclusive citou um episódio ocorrido em 2009, a análise da cassação do mandato do então deputado federal Edmar Moreira, que culminou no afastamento do relator Sérgio Moraes por ele ter antecipado seu voto sobre a acusação.

De fato, naquele episódio, houve manifestação de mérito fora dos autos, antecipadamente. Não é o caso agora. Lembro que, nesta fase do processo, não cabe a apresentação da defesa, o que ocorre somente após a eventual aprovação do parecer.

Eu apenas cumpri meu dever de maneira célere, sem açodamento, mas também sem procrastinação.

Acredito na democracia e tenho a certeza de que, apesar de todos os percalços que o país vem experimentado, estamos avançando no fortalecimento de nossas instituições.

Não há dúvidas de que, em razão dessa perspectiva, nossos filhos e netos poderão viver em um país melhor.

FAUSTO PINATO, 38, é deputado federal (PRB-SP) e relator do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados

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