Folha de S. Paulo


Chico Alencar

Denúncia vazia, má-fé plena

"A ética é a estética de dentro", disse o poeta francês Pierre Reverdy, nascido no ano da proclamação da nossa República. Esta jovem senhora de 126 anos está precocemente envilecida. A "alma" da Câmara dos Deputados obscurece em chantagens e golpes baixos.

Pioneiro na luta pela elucidação das tenebrosas transações pelas quais Eduardo Cunha é investigado, o PSOL virou alvo da fúria da tropa de choque do presidente da Casa. As ações no Conselho de Ética contra mim e Jean Wyllys e, na Corregedoria, contra Edmilson Rodrigues e Glauber Braga, se inserem nessa ofensiva.

O deputado Paulo Pereira (o Paulinho da Força), do Solidariedade, se autoindicou membro titular do Conselho de Ética. Visa, declaradamente, defender seu aliado Cunha e nos atacar, "pois não esqueceu a ação de 2008" movida contra ele, pelos fatos que o tornaram réu de uma ação penal no STF (Supremo Tribunal Federal).

As peças vingativas, orientadas por Cunha, não são propriamente representações, mas retaliações. São repletas de afirmações enganosas, de mera "vendetta" política, que não merecem respostas, mas sim desmentidos.

No meu caso, a primeira "denúncia" é a de que recebi doações de membros da minha equipe. É verdade: eu e pelo menos 125 deputados reeleitos, inclusive o próprio acusador! Doações voluntárias e declaradas, absolutamente legais, que não excederam o teto permitido, como atesta a Justiça Eleitoral. Contribuições de 82 pessoas físicas vieram espontaneamente para a minha campanha, uma das cinco menos dispendiosas entre os 46 eleitos pelo Rio de Janeiro: R$ 180.746,65. Ainda há quem faça política com espírito coletivo e busca do voto de opinião.

A segunda "acusação", tão pífia como a primeira, é a de que utilizei "empresa fantasma" para fazer peças publicitárias de campanha por meio de "volumosas quantias" da cota parlamentar.

Os autores do texto esqueceram as regras da Câmara, que proíbem reembolso de prestação de serviços eletrônicos via internet 120 dias antes das eleições. A empresa contratada, de fato, tornou-se irregular a partir de 2009, cometendo a irresponsabilidade de não nos informar, nem ao órgão da Câmara que verifica as notas fiscais.

Os serviços continuaram a ser prestados, as notas foram aceitas. Ao tomar conhecimento do problema, ressarci os cofres públicos, ainda no mandato passado, até para evitar uma exploração política baixa como esta.

O Ministério Público abriu procedimento investigatório, como é seu dever –e sobre vários deputados, diga-se. Em agosto, a procuradora Mirella Aguiar determinou, no meu caso, o arquivamento do processo. Em seu parecer, ela destacou a "boa fé do deputado", a "inexistência de qualquer improbidade administrativa", a "comprovação do serviço prestado" e o "integral, pleno e espontâneo ressarcimento ao erário".

É inepta uma iniciativa baseada em denúncias vazias e matérias que já passaram pelo crivo dos órgãos específicos, bem como as que visam calar os parlamentares mais críticos.

Ética como "estética de dentro" pressupõe caráter, transparência e moralidade pública. Não há botox para melhorar a fisionomia que livre quem quer que seja de pagar por práticas como peculato, corrupção, lavagem de dinheiro, evasão de divisas ou formação de quadrilha.

Disso ou de qualquer outro crime do gênero nenhum de nós do PSOL está sendo acusado ou investigado. A verdade prevalecerá!

CHICO ALENCAR, 66, é professor de história e deputado federal (PSOL/RJ)

*

PARTICIPAÇÃO

Para colaborar, basta enviar e-mail para debates@grupofolha.com.br.

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.


Endereço da página:

Links no texto: