Folha de S. Paulo


Paul Polman

Mudanças climáticas: o negócio é sério

Há mais de 250 anos, um empreendedor britânico chamado Richard Arkwright construiu a primeira máquina têxtil automática. Ao fazê-lo, deu início à Revolução Industrial –uma era movida a carvão e, com o passar dos anos, também a petróleo e gás. Esse período transformou a vida e a paisagem na Terra, tirou bilhões de pessoas da pobreza e criou grandes fortunas.

A queima de combustíveis fósseis, no entanto, não mudou apenas nossa maneira de viver e trabalhar: ela mudou o planeta. Por isso, agora é preciso renovar nosso jeito de fazer negócios. O custo da inação é alto demais. Se continuarmos no mesmo caminho, vamos colocar em risco a segurança nacional e mundial, e também a prosperidade econômica.

Ao longo da última década, os custos impostos por intempéries extremas nos Estados Unidos ultrapassaram 300 bilhões de dólares. Eles incluem episódios como o furacão Sandy e as secas que castigam a Califórnia e o Texas. São Paulo, responsável por um terço do PIB brasileiro e dependente de fontes hidrelétricas para obter 80% da energia que consome, atravessa a pior seca das últimas oito décadas.

Segundo a ONU, desde o ano 2000 as perdas associadas a desastres naturais foram de 2,5 trilhões de dólares –e esses eventos são cada vez mais atribuídos ao aquecimento do planeta. De acordo com nossos cálculos, apenas na Unilever os custos ligados aos efeitos das mudanças climáticas chegam a 300 milhões de euros por ano.

A boa notícia é que mudanças trazem oportunidades. Elas representam uma chance de transformar as empresas, cortar custos, reduzir riscos e incentivar a inovação. Publicado no ano passado pela Comissão Global sobre Economia e Clima (iniciativa internacional capitaneada pelo ex-presidente do México, Felipe Calderón), o relatório Better Growth, Better Climate (do inglês, Crescimento Melhor, Clima Melhor) demonstra que crescimento econômico e ações de combate às mudanças climáticas não precisam estar em confronto.

Ao contrário: combinado à rápida adoção de fontes de energia limpa, o crescimento das cidades representa uma oportunidade de negócios que chega à casa dos trilhões.

Nossa empresa tem apresentado possibilidades semelhantes. A proposta de reduzir nosso impacto ambiental ajudou a economizar mais de 400 milhões de euros desde 2008. Em 2014, nossas marcas com propósito sustentável responderam por metade do crescimento da empresa, e cresceram duas vezes mais rápido que as demais. Ou seja: os consumidores estão votando com o bolso.

Isso ajuda a garantir a oferta. Mais de 55% das matérias-primas agrícolas usadas pela Unilever já são de origem sustentável. Esse número mostra que superamos metade do caminho na nossa meta de atingir 100% até 2020. Para chegar lá, estamos ajudando pequenos agricultores a aumentar a produtividade - até o momento, já treinamos 800 mil pessoas.

Ao longo dessa jornada, contribuímos para melhorar a vida de muita gente, e preparamos nossa organização para enfrentar o futuro em um mundo volátil. Estamos provando que uma empresa pode crescer e, ao mesmo tempo, reduzir os impactos ambientais e aumentar os benefícios sociais.

Fico ainda mais animado ao perceber que os jovens são os primeiros a entender essa lógica. Além daqueles que estavam entre as centenas de milhares de participantes da Marcha Popular pelo Clima, realizada em março em Nova York e outras cidades do mundo, há também os jovens empreendedores que venho conhecendo, capazes de compreender que a inovação pode melhorar a vida de milhões de pessoas.

Dentro de apenas sete meses, líderes de mais de 190 países vão se reunir em Paris para assinar um acordo sobre o clima. O caminho à frente ainda é longo. No passado, houve quem criticasse as primeiras fábricas que adotaram os teares mecanizados de Arkwright; da mesma maneira, sempre haverá céticos e detratores representando interesses escusos, ou paralisados por uma apatia assustadora.

Mas as empresas estão abraçando essa oportunidade. Cada vez mais negócios exigem metas ambiciosas por parte dos governos. Mais de mil organizações assinaram a Declaração sobre o Preço do Carbono, produzida pelo Banco Mundial, que conclama governantes a adotar um preço para o carbono.

Integrantes do chamado B-Team, do qual eu e sir Richard Branson fazemos parte, pedem uma meta de Emissões Líquidas Zero até 2050. É um objetivo difícil, mas necessário para minimizar os riscos impostos ao planeta e maximizar as oportunidades para os negócios.

Daqui a muitos anos, quando o mundo olhar para trás e enxergar 2015 em retrospecto (assim como falamos hoje sobre a grande invenção de Richard Arkwright), espero que este ano seja visto como o momento da virada, um marco no início da segunda grande revolução industrial: o ano em que governos, líderes de negócios e sociedade civil se uniram para estabelecer os alicerces de um mundo melhor.

PAUL POLMAN, 59, é presidente-executivo da Unilever e presidente do World Business Council for Sustainable Development (Conselho Empresarial Mundial para o Desenvolvimento Sustentável)

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