Folha de S. Paulo


editorial

Questão de maturidade

A Câmara dos Deputados pode retomar nesta semana a votação da proposta que reduz de 18 para 16 anos a maioridade penal no Brasil.

Aprovada no início de julho após manobra de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Casa, a iniciativa, por importar mudanças na Constituição, precisa passar por um segundo turno antes de ser encaminhada para o Senado.

Tudo leva a crer que os deputados federais pretendem confirmar a posição expressada 40 dias atrás –quando 323 deles se manifestaram a favor do endurecimento legislativo–, mas a plena vigência dessa medida não está no horizonte próximo. Felizmente.

Se obtiver o aval das duas Casas do Congresso, a proposta de emenda constitucional enfrentará a resistência da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). O presidente do conselho federal da entidade, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, já afirmou que questionará a norma no Supremo Tribunal Federal.

Esse expediente, no entanto, talvez nem seja necessário. Ainda em meados de julho, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), indicou que atuará contra a diminuição da idade penal. "Eu não defendo a redução da maioridade. O mundo caminha na direção contrária", declarou.

Entre os senadores parece prevalecer esse entendimento, o qual não se confunde com omissão diante da sensação de insegurança que aflige a população. Com efeito, no mesmo intuito de dar atenção aos casos de adolescentes envolvidos em atrocidades, o Senado aprovou um projeto de lei bem mais adequado que a PEC da Câmara.

Trata-se, em linhas gerais, de modificar o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) a fim de permitir que o menor infrator permaneça afastado da sociedade por até dez anos, desde que tenha "praticado, mediante violência ou grave ameaça, conduta descrita na legislação como crime hediondo ou homicídio doloso".

Como esta Folha sustenta há bastante tempo, não há por que limitar a três anos a internação máxima possível dos jovens mais violentos (como impõe a lei atual), mas tampouco faz sentido tratá-los como adultos e despejá-los no sistema prisional. Daí a criação de um regime especial para eles, balizado por critérios claros e rígidos.

Dessa forma, sem afrontar a idade penal estabelecida pela Constituição, o legislador ofereceria uma resposta mais proporcional à selvageria de alguns episódios.

Talvez seja em vão, mas não custa torcer para que os deputados tenham maturidade para entender que o projeto do Senado é melhor do que aquele gestado na Câmara.

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