Folha de S. Paulo


editorial

Prostração industrial

Entre todos os setores abatidos pela crise que assola o país –e é difícil imaginar que algum poderia passar incólume por 2015–, nenhum parece sofrer efeitos tão drásticos quanto a indústria, atingida em cheio pelos erros de política econômica acumulados ao longo dos últimos anos.

Com o recuo de 0,3% em junho (em relação a maio), a indústria terminou o segundo trimestre com produção 2,1% menor que nos três meses anteriores. No semestre, a retração chega a 6,3%.

Os estoques fabris, todavia, ainda estão em níveis elevados, segundo a FGV –sinal de que a redução da produção não tem bastado para compensar a queda das vendas. É difícil ser otimista nesse cenário, e a maior parte dos empresários espera mais do mesmo no segundo semestre.

As dificuldades vêm de longe. Na década encerrada em 2014, o setor amargou continuada perda de competitividade devido a uma combinação de custos internos em elevação, sobretudo salariais, com tendência de valorização do real.

Diante desse quadro adverso, foram de pouca valia, quando não equivocados, os estímulos dos governos petistas. Isolamento das cadeias mundiais de produção, fechamento do mercado interno e regras restritivas de conteúdo nacional, entre outros itens, completaram o conjunto de descalabros.

Não por acaso, o país passou de uma posição de equilíbrio no comércio exterior de manufaturados, até meados da década passada, para deficit cada vez maiores, que atingiram US$ 110 bilhões em 2014.

Na prática, ao longo desses dez anos, o país perdeu centenas de bilhões de dólares de demanda por seus produtos manufaturados, seja por falta de acesso a mercados externos, seja por ocupação de espaço local por importações.

Há, porém, mudanças de fundo no quadro econômico que apontam para uma nova orientação estrutural para a indústria. A valorização cambial está sendo corrigida, e a recessão contribui para moderação das demandas salariais. Algumas empresas começam a optar por componentes locais e até pensam novamente em exportar.

É um movimento lento, e não será suficiente ter condições de salário e câmbio no lugar certo. É preciso complementá-las com uma estratégia de integração com centros produtivos dinâmicos, custos decrescentes de impostos e logística e mais inovação. O quadro global de pequeno crescimento de comércio tampouco é favorável.

Mesmo assim, pode-se argumentar que o país começa a corrigir os desequilíbrios mais gritantes e que um novo espaço estrutural para a indústria pode se abrir nos próximos anos. É preciso agarrar essa nova chance com uma estratégia coerente e de longo prazo.


editoriais@uol.com.br


Endereço da página:

Links no texto: