Folha de S. Paulo


Onyx Lorenzoni

O primeiro passo

São poucas as vezes em que a vida nos dá uma chance para rever decisões e trilhar caminhos diferentes. Escolher uma palavra mais adequada para certos momentos, abraçar fortemente alguém que, descobriremos depois, nunca mais veremos. Por serem raras, não podemos deixar as oportunidades nos escaparem.

A Câmara dos Deputados e seus 513 parlamentares estiveram diante de um desses momentos únicos e históricos nesta semana. Ignorar o clamor das ruas teria sido um erro. Seria a indevida negação do princípio democrático.

Da primeira vez que a redução da maioridade penal chegou ao plenário da Câmara, apenas cinco votos nos separaram do anseio de 87% dos entrevistados ouvidos pelo Datafolha. Esta expressiva parcela da população –9 em cada 10 brasileiros– é a favor da redução da maioridade penal de 18 para 16 anos.

Mas como em muitos momentos da vida, lutamos por uma segunda chance. E ela não demorou a chegar. Buscamos e encontramos no regimento da Casa a base legal para que emendas aglutinativas de texto pudessem novamente reaproximar o clamor da população brasileira do voto de seus legítimos representantes.

O caminho escolhido não foi o da pura e simples redução, tanto criticada pelos operadores do direito na área da infância e da adolescência. Na madrugada de quinta-feira, o plenário foi equilibrado e coerente, estabelecendo, na emenda aglutinativa aprovada, a redução pontual da maioridade penal de 18 para 16 anos. Levou em conta os crimes de violência contra a vida ou contra a dignidade da existência humana.

E quais são eles? São aqueles que mais chocam uma sociedade que clama pelo fim da impunidade: crimes hediondos, homicídios dolosos e lesões corporais seguidas de morte. Destacam-se, nos hediondos, latrocínio, estupro e sequestro. Traduzindo: ataques inomináveis contra a vida humana e que devem ser punidos exemplarmente para todos aqueles que têm maturidade suficiente para escolher se praticam ou não atos de extrema violência.

Insistir num modelo que pune apenas as vítimas é uma covardia contra quem nos elegeu, contra quem representamos em Brasília. Alterá-lo é sinal de sabedoria e de respeito à sociedade.

É correto defender a juventude, mas quem comete atrocidades só pode ser chamado de criminoso. Errado e injusto é ignorar os erros e a dor daqueles que foram vítimas e suas famílias, estes sim condenados a carregar a dor para a vida inteira, enquanto o menor, no máximo, cumpre medida socioeducativa e aos 18 anos sai de ficha limpa, como se nada tivesse feito. Como está hoje, a lei só reforça o sentimento de impunidade.

Ainda temos um longo caminho a percorrer. Mas o primeiro passo foi dado no dia 2 de julho. Ela ainda precisa ser analisada em segundo turno pela Câmara antes de seguir para o Senado, onde precisa ser aprovada também em dois turnos.

Crime grave deve ter punição severa. É hora de mudar a lei e fazer justiça. É preciso fazer com que verdadeiros criminosos, que hoje se escondem sob a sombra da impunidade, paguem por seus crimes.

ONYX LORENZONI, 60, é deputado federal (DEM-RS)

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