Folha de S. Paulo


Editorial: Sigilo perene no BNDES

Como era de prever, a presidente Dilma Rousseff (PT) vetou de medida provisória sobre o BNDES artigo que extinguia o sigilo de operações de financiamento subsidiado. O governo petista, portanto, se aferra ao vício segredista que só faz multiplicar suspeitas quanto ao uso do banco para favorecer empresas amigas do poder.

O exemplo mais notório é o do grupo JBS/Friboi. O conglomerado iniciou desempenho meteórico no governo Luiz Inácio Lula da Silva com apoio decidido do BNDES –o montante já captado ultrapassou a casa de R$ 8 bilhões.

A JBS tornou-se o maior financiador de campanhas eleitorais em 2014. Despendeu nada menos que R$ 391 milhões (R$ 280 milhões mais que a Odebrecht, segunda colocada), o que levanta questionamento natural acerca de suas relações com o governo de turno.

A Operação Lava Jato tem demonstrado o quanto doações privadas podem se misturar à alta corrupção. Apesar disso, até auditores do Tribunal de Contas da União enfrentam obstáculos para obter informações sobre transações do banco com a JBS –questão que volta à pauta do Supremo Tribunal Federal nesta terça-feira (26).

Na mensagem de justificação do veto, a Presidência reitera o argumento surrado de que a publicação dos relatórios de análise do BNDES, como reivindica na Justiça esta Folha, implicaria quebra de sigilos bancário e empresarial.

Ora, cabe lembrar que o banco lida com dinheiro do contribuinte, e não é pouco: R$ 188 bilhões em 2014. Ocultar do público como o Planalto lança mão desse cabedal dá ao governo o poder de operar um orçamento paralelo, imune ao crivo do Congresso e de outras instituições de controle.

Nenhum empresário está obrigado a tomar dinheiro do BNDES, se não quiser que a luz do sol incida sobre o negócio financiado. Como o banco é uma instituição de Estado, deveria dar prioridade ao interesse geral sobre o privado e consagrá-la em duas ações.

Primeiro, de ora em diante, condicionar a concessão de empréstimos à publicidade de seus termos detalhados. Segundo, divulgar as análises internas de negócios passados e futuros, ainda que omitindo informações que obviamente representem rompimento de sigilos protegidos por lei.

É ônus do BNDES e do Planalto provar que a omissão de condições favorecidas ao dispor de recursos públicos resulta só de obediência à lei. Se faltarem com isso, tornarão perene a desconfiança de que o manto de segredo se presta a acobertar práticas inconfessáveis.


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