Folha de S. Paulo


Editorial: Batalhas e guerras

Enganou-se quem imaginou que, após a pressão das manifestações de junho de 2013, deputados e senadores se dariam por vencidos na guerra intermitente que travam com o Ministério Público.

Na esteira dos protestos, os congressistas não tiveram alternativa senão aniquilar a proposta de emenda constitucional que restringiria a atuação do órgão na investigação criminal. A chamada PEC da Impunidade recebeu 430 votos contrários e 9 a seu favor. Para parte do Legislativo, estava perdida uma batalha –nada mais que isso.

Passados quase dois anos daquela ocasião e redirecionados os ânimos não mais contra a classe política em geral, mas contra o PT e seu governo em particular, alguns parlamentares se sentiram à vontade para voltar à carga.

Com o apoio do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o deputado federal Paulinho da Força (SDD-SP) começou a coletar assinaturas de colegas para tentar emendar a Constituição no sentido de proibir a recondução do procurador-geral da República.

Segundo o deputado, a emenda conta com o aval do bloco liderado pelo PMDB, formado também por PP, PTB, PSC, PHS e PEN.

Esgrimindo argumentos de caráter institucional, como a necessidade de oxigenar a cúpula do Ministério Público Federal (MPF), Paulinho busca disfarçar o óbvio: a iniciativa surge como represália ao atual ocupante do cargo, Rodrigo Janot, responsável por conduzir inquéritos contra políticos no âmbito do Supremo Tribunal Federal.

Entre os 50 nomes investigados na corte em decorrência da Operação Lava Jato, que apura desvios bilionários na Petrobras, está o de Cunha, a quem não têm faltado palavras críticas em relação a Janot.

É fácil perceber o impacto que a nova regra pode ter no desenrolar do caso. Se for aprovada no primeiro semestre, como querem vários congressistas, o procurador-geral precisará deixar a tarefa pelo caminho em setembro, quando termina seu mandato de dois anos.

A intervenção decerto interessa aos suspeitos, mas não ao restante da sociedade. Processos mais complexos dificilmente se resolvem em pouco tempo, e o julgamento do mensalão demonstrou o quanto a acusação se beneficia com a continuidade dos trabalhos.

Se Eduardo Cunha e Paulinho da Força, entre outros, de fato quiserem aprimorar o MPF, bem que poderiam alterar a indicação do procurador-geral da República, hoje livremente escolhido pela Presidência entre os integrantes da carreira que tenham mais de 35 anos.

A instituição teria muito a ganhar em independência se, a exemplo do que ocorre nos congêneres estaduais, seu chefe fosse pinçado necessariamente de uma lista tríplice elaborada pela corporação.


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