Folha de S. Paulo


Editorial: Planejar e garantir

Talvez o maior benefício da crise hídrica paulista, se é que cabe falar nesses termos diante de situação tão dramática, esteja no salto de transparência e conscientização sobre a escassez desse recurso natural. Dois verões de estiagem grave deram ao tema o destaque que há muito tempo merece.

Graças à seca, muitos absurdos chegaram ao conhecimento do público. Um exemplo gritante, de que poucos tinham notícia, está na ausência de reservatórios de abastecimento na rica região de Campinas.

A cidade de 1,15 milhão de habitantes distribui água retirada diretamente do rio Atibaia, sem reservação alguma. Mas agora, finalmente, essa anomalia começará a ser desfeita –se o poder público conseguir executar o que planeja.

Duas novas represas estão em estudo: Pedreira, no rio Jaguari, e Duas Pontes, no Camanducaia. Ambos são afluentes do Piracicaba, que, com o Capivari e o Jundiaí, integra a bacia PCJ –célebre por ceder águas para o sistema Cantareira, epicentro da crise na região metropolitana de São Paulo.

A função de Pedreira e Duas pontes é regularizar o manancial disponível para os 5,5 milhões de habitantes da área da PCJ. As represas, com 67 bilhões de litros de volume útil (menos de 10% do maior reservatório do Cantareira, Jaguari-Jacareí), agregarão 6.000 litros/segundo à vazão garantida dos dois rios para abastecimento urbano.

O novo total será de 16,4 mil litros por segundo. Para comparação, o Cantareira teve sua produção reduzida de 31,9 mil para 13 mil litros por segundo, o bastante para atender 5,3 milhões de pessoas.

A construção de duas represas como essas não se faz sem algum dano ambiental. Uma área de 1,5 km2 terá de ser desmatada e compensada com recomposição florestal em torno das represas. Estradas e duas pequenas centrais hidrelétricas serão alagadas.

Segundo o Departamento de Águas e Energia Elétrica, os projetos executivos e os estudos de impacto ambiental devem ficar prontos em junho, condição para iniciar o licenciamento na Cetesb. Como o prazo de construção é da ordem de 30 meses, pode-se afirmar que a solução não se concretizará antes de meados de 2018.

Isso se os projetos não contiverem falhas, se as licenças e as licitações não enfrentarem questionamentos judiciais, se os contratos não precisarem ser revistos etc.

A água é um recurso finito e cada vez mais escasso; a burocracia e a ineficiência, não. São Paulo não foge à regra, como provou a crise.


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