Folha de S. Paulo


Editorial: Alternância na Nigéria

A jovem democracia da Nigéria saiu-se bem no teste a que foi submetida no último fim de semana.

Na mais acirrada disputa presidencial desde 1999, quando a população passou a escolher seus representantes pelo voto direto, venceu o candidato da oposição, encerrando um período de 16 anos consecutivos de domínio do PDP (People's Democratic Party).

Essa inédita alternância de poder não deve ser subestimada. Elemento fundamental em qualquer regime democrático, sua ocorrência atesta o progresso político-partidário do país mais populoso da África (aproximadamente 175 milhões de habitantes).

Além disso, muitos dos temores pré-eleitorais não se confirmaram. Se em 2011 cerca de mil pessoas morreram em confrontos entre adversários políticos, agora se registraram menos de 50 mortes, a maioria das quais ligadas a ataques da milícia extremista Boko Haram.

Os próprios candidatos colaboraram para o ambiente pacífico, evitando ações e discursos que pudessem açular correligionários.

Também se dissiparam as dúvidas sobre a nova tecnologia de identificação do eleitor. Embora tenha apresentado falhas pontuais que resultaram em filas em algumas localidades, o sistema ajudou a diminuir expressivamente os níveis de fraude, tornando este o pleito mais limpo da história nigeriana.

Receava-se, por fim, que a divisão de sufrágios reproduzisse as cisões étnicas e religiosas do país. Contudo, tanto o opositor Muhammadu Buhari, muçulmano do norte, como o presidente Goodluck Jonathan, cristão sulista, obtiveram boas votações fora de suas circunscrições por assim dizer naturais.

Não surpreende que o sucesso eleitoral na maior economia africana (PIB de cerca de US$ 520 bilhões em 2014) esteja sendo visto como um grande exemplo para outros países do continente.

A vitória de Buhari tampouco deve ser tomada com surpresa. O militar reformado que comandou o país por 20 meses como ditador no começo dos anos 1980 já havia concorrido à Presidência em outras três oportunidades.

Desta vez, sua imagem de político incorruptível e linha-dura encontrou ressonância numa sociedade aterrorizada pela facção islâmica Boko Haram –que tem matado milhares de pessoas– e cansada dos escândalos que proliferaram na gestão de Jonathan.

Enfrentar essas duas questões, bem como reduzir a dependência do país em relação às vendas do petróleo, constitui a principal tarefa do novo presidente da Nigéria pelos próximos quatro anos.


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