Folha de S. Paulo


Editorial: Síria nas trevas

Trevas reais e metafóricas tomaram conta da Síria. A escuridão, captada em fotos de satélite, é marca visível da destruição provocada por quatro anos de guerra civil. No período, 83% da iluminação noturna se extinguiu em todo o território; em Aleppo, uma das principais cidades, o índice chega a 97%.

A dramática redução da mancha luminosa se explica não só pela escassez de energia elétrica, mas também pelo aniquilamento da infraestrutura e pela fuga da população.

O país ingressa no quinto ano de um conflito que já matou mais de 220 mil pessoas sem que haja perspectiva de paz no curto prazo. Mesmo que isso ocorresse, contudo, o futuro próximo ainda seria sombrio, a julgar pelo relatório do Centro Sírio de Pesquisas Políticas, feito com o apoio da ONU.

Com a economia arrasada pelo conflito, a Síria acumula perdas da ordem de US$ 200 bilhões em quatro anos, o equivalente ao triplo do PIB de 2010. Nesse ínterim, quase 3 milhões de pessoas perderam o emprego, o que elevou a taxa de desocupação de 15%, em 2011, para 58%, no final de 2014.

A educação encontra-se em estado de colapso, com 51% das crianças em idade escolar fora dos bancos estudantis no biênio 2014-2015.

As terríveis condições impostas pela guerra também reduziram a expectativa de vida da população em expressivos 20 anos. Hoje, um sírio vive em média 55,7 anos.

Os combates também levaram uma quantidade imensa de pessoas a buscar condições menos abjetas. Estima-se que 7 milhões de habitantes tenham se deslocado internamente. Outros 3,5 milhões buscaram guarida no exterior.

Se a destruição veio depressa, a recuperação econômica e social –quando começar– deverá levar décadas. O país está fragmentado, com vastas áreas dominadas pela facção radical Estado Islâmico e repleto de conflitos paralelos. O governo do ditador Bashar al-Assad domina a capital Damasco e outras cidades populosas, mas as forças insurgentes prevalecem no nordeste e no noroeste.

Após quatro anos de conflito, começa a ganhar corpo a ideia de que qualquer solução, além de se dar pela via diplomática, precisará envolver negociações com Assad, como afirmou recentemente o secretário de Estado dos EUA, John Kerry. Esta talvez seja, de fato, a única maneira de as luzes um dia voltarem a brilhar na Síria.


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