Folha de S. Paulo


André Luís Woloszyn: Terrorismo islâmico reconfigura a governança global

As atrocidades que vem sendo cometidas por grupos terroristas como o EILL (Exército Islâmico do Iraque e do Levante) na Síria e no Iraque, o Boko Haram que aterroriza a Nigéria e o Talibã, com atuação no Paquistão e Afeganistão, perpassam a compreensão ocidental sobre valorização humana ou mesmo sobre a preservação da vida.

A ideologia extremista, ligada uma interpretação religiosa distorcida dos mandamentos islâmicos do Corão é tão intensa e internalizada nestes grupos que torna-se impossível qualquer diálogo reconciliador.

O maior paradoxo, na tentativa de enfrentá-los belicamente, é de que, de um lado, estão pessoas que embora estejam envolvidas em operações militares de alto risco, tem receio de perderem a vida. Enquanto do outro, existem pessoas dispostas a se tornarem mártires da causa que professam.

Este parece ser o fator fundamental para tantos insucessos, a mais de uma década, na tentativa de reduzir sua impetuosidade, embora o emprego das mais avançadas tecnologias tenham sido empregadas.

Pela conjuntura atual, podemos afirmar, que ao contrário do que se supunha, as operações militares serviram apenas para fomentar o surgimento de novos combatentes extremistas com táticas mais avançadas do que as empregadas pela rede Al Qaeda.

Uma destas táticas, é o recrutamento disseminado de combatentes ocidentais em massivas campanhas de marketing na web para lutarem na Síria, e que, ao retornarem a seus países de origem, são potencialmente uma ameaça para a perpetuação de novos atentados.

Vale destacar que ao contrário da percepção comum de que seus integrantes são pessoas sem instrução ou especialidade, as lideranças terroristas vem demonstrando possuírem conhecimentos estratégicos e táticos similares aos dos comandantes das forças regulares. Caso contrário, o quadro seria outro.

É importante dizer, que o contexto atual, aponta para um aumento das atividades terroristas desta natureza, já ocorridas na Austrália e recentemente na França, e trazem importantes reflexos para as sociedades ocidentais.

Um destes reflexos, se fará sentir por todos, que é o recrudescimento da vigilância, monitoramento e controle dos cidadãos por novas tecnologias, o que atinge diretamente a privacidade e a intimidade das pessoas.

Outro real impacto, é o fomento global a xenofobia e discriminação em relação às comunidades muçulmanas, tidas como simpatizantes ou apoiadoras do terrorismo extremista.

No plano da governança global, o terrorismo islâmico vem, de forma lenta, porém gradual, reconfigurando as políticas governamentais no que tange a adoção de ações e medidas de contraterrorismo que afetam a liberdade dos cidadãos, um dos principais valores das democracias.

Podemos dizer, por enquanto, que tais grupos tem atingido plenamente um de seus principais objetivos, que além de produzir vítimas, é alcançado com o sentimento generalizado de insegurança e intranquilidade nas populações de diversos países.

ANDRÉ LUÍS WOLOSZYN é especialista em contraterrorismo e analista de assuntos estratégicos, diplomado pela Escola Superior de Guerra

*

PARTICIPAÇÃO

Para colaborar, basta enviar e-mail para debates@uol.com.br.

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.


Endereço da página:

Links no texto: