Folha de S. Paulo


Fernando Collor: Consolidação democrática, 25 anos

O processo de nossa redemocratização durou uma década. O primeiro passo relevante se deu em 1979 com a Lei da Anistia, que permitiu a repatriação dos exilados. Em seguida, o fim do bipartidarismo. O processo continuou com o movimento das Diretas-Já, em 1984 e, no ano seguinte, com a eleição de Tancredo Neves para presidente, eleito por um colégio eleitoral. A posse do seu vice-presidente assegurou a volta dos civis ao comando do país.

Coube à habilidade e sensibilidade do presidente José Sarney dar prosseguimento ao avanço político então em curso, garantindo ao Brasil uma Assembleia Constituinte. Assim, em 1988, o Brasil ganhou sua Constituição cidadã, cujo principal instituto político nos trouxe de volta as eleições livres e diretas.

Mas foi em 1989 que chegamos à culminância da redemocratização, com a primeira eleição direta para presidente da República depois do regime militar. Dela, participaram 22 candidatos representando o amplo espectro político da vida nacional. Foi a consolidação necessária para iniciarmos mais um período da nossa democracia, cujo passado histórico sempre nos mostrou ser conturbada, célere e instável.

Será sempre motivo de honra e orgulho para mim ter me sagrado vencedor, tanto no 1º como no 2º turno –em 17 de dezembro de 1989–, daquele histórico pleito e assumido como o primeiro presidente da República eleito diretamente pela população depois de um período de mais de 20 anos de recrudescimento político.

Aquele momento foi, de um lado, o ponto final da transição política e, de outro, o ponto de partida da estabilização democrática que caminha hoje para ser a mais duradoura e representativa de nossa vida republicana. De lá para cá, durante esses 25 anos, testemunhamos um revigoramento institucional crescente do Estado brasileiro.

Em 2014, tivemos a sétima eleição presidencial consecutiva desde 1989. É a prova de que, olhando para trás, deixamos de ser uma República de frequentes instabilidades políticas e alguns espasmos democráticos, para ser hoje uma nação em que os períodos discricionários passaram a ser exceção.

Eleições, porém, marcam apenas momentos pontuais da democracia. Trata-se de um dos componentes do sistema democrático, uma condição sem dúvida necessária, mas não suficiente. Muito ainda precisamos evoluir. Como ensinou o filósofo italiano Norberto Bobbio, em um regime democrático, o estar em transformação é seu estado natural: a democracia é dinâmica, o despotismo é estático.

Para manter essa dinâmica e a evolução institucional do Brasil, dois aspectos merecem reflexão. Primeiro, o alerta dado há dois séculos pelo pensador Benjamin Constant –contrapondo a grande formulação de Montesquieu–, de que o problema não é a divisão dos Poderes, mas a quantidade de poder que se deve dividir entre eles.

Hoje as prerrogativas de governo não podem mais ser divididas apenas entre os Poderes constituídos, menos ainda pela concentração ou hipertrofia de um deles.

Um segundo aspecto é o de que, além de um real equilíbrio de forças para que a democracia sobreviva à poliarquia, aquelas prerrogativas precisam ser partilhadas também com a sociedade.

Nas palavras do cientista político John Mearsheimer, as democracias operam melhor quando incluem um mercado razoavelmente eficaz de ideias, que só funciona quando os cidadãos têm informações seguras e existem altos níveis de transparência e honestidade.

Isso não vale apenas para governos e instituições, mas alcança todos os pilares da democracia, inclusive a imprensa, cuja liberdade exige acima de tudo responsabilidade, coerência e isenção.

FERNANDO COLLOR, 65, senador reeleito pelo PTB de Alagoas, foi presidente da República (1990-1992)

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