Folha de S. Paulo


Érica Fraga: Esperança na educação

Em um domingo de sol e calor intenso, mais de 630 adolescentes trocaram o lazer por uma prova que selecionará os primeiros 72 alunos de uma escola integral nova que terá foco em matemática, inglês e mandarim.

A cena poderia combinar com o contexto de superpotências educacionais como China, Coreia ou Polônia, mas ocorreu no Estado do Rio de Janeiro em 19 de outubro.

Nenhum desses jovens estava ali por obrigação. Foram batalhar por um futuro melhor, o que denota razões para esperança por trás dos indicadores ruins de qualidade da nossa educação.

Para um país com desempenho pífio em testes de matemática, é animadora a acirrada disputa por vagas em uma escola de ensino médio com carga horária puxada e que será voltada, justamente, para o aperfeiçoamento em ciências exatas.

A relação de quase nove candidatos por vaga para as primeiras turmas do novo colégio, localizado em Niterói, foi a mais alta entre as 27 escolas com conceito parecido –jornada integral e especialização em uma área do conhecimento– criadas nos últimos quatro anos no Rio.

Talvez seja um sinal de que, apesar de todas as falhas do ensino fundamental, o interesse pela matemática segue vivo em um grande número de adolescentes. É preciso, porém, despertá-lo.

Parte da estratégia do governo do Rio tem sido ir até alunos e pais e passar uma mensagem de comprometimento com a melhoria da educação.

O discurso é aliado a ações práticas. A escola de matemática resultou de um convênio com o governo chinês, que vai viabilizar livros, uniformes e as aulas de mandarim e inglês.

O novo conceito de educação que está sendo desenvolvido no Rio, com apoio do Instituto Ayrton Senna, busca ainda estimular nos jovens a aquisição de habilidades não cognitivas como autodisciplina e meticulosidade.

Essas iniciativas têm contribuído para um forte avanço na qualidade da educação do ensino médio na rede estadual. Não se trata de um caso isolado. Outros Estados e municípios brasileiros também têm conseguido saltos educacionais relevantes.

As receitas de sucesso não são segredo industrial. Um estudo da Fundação Lemann mapeou práticas em comum de escolas públicas que têm garantido ótima aprendizagem a alunos de baixa renda.

Ações como o acompanhamento contínuo do desempenho dos alunos, apoio aos que estão indo mal e estímulo aos que se destacam fazem a diferença. Mas é preciso que ganhem escala, o que só ocorrerá com uma frente de mobilização que alce a educação ao topo das prioridades nacionais.

No discurso, ela já encostou lá. Na prática, está longe de ser tratada com a urgência necessária.

ÉRICA FRAGA é repórter especial da Folha


Endereço da página: