Folha de S. Paulo


Editorial: Estatística cultural

A análise de números e porcentagens nem sempre combinou com a "forma mentis" dos interessados em cultura. Mas, com os grandes patrocínios privados, as ações de fomento estatal, a amplificação do ensino superior e o entretenimento de massa, tornou-se patente a necessidade de levantamentos estatísticos também nessa área.

A "Ilustrada" da última sexta-feira (7) dá notícia de ampla pesquisa sobre os hábitos culturais no Estado de São Paulo. Se o exame dos dados –recolhidos de cerca de 8.000 entrevistas em 21 cidades com mais de 100 mil habitantes– deve ainda ser feito em minúcia, ressaltam da reportagem informações de notável relevância.

Não parece ser a renda, por exemplo, o fator determinante para levar os cidadãos com frequência aos museus. Em 42% dos entrevistados da classe C, mas com formação superior, o hábito se registra, enquanto que, nas classes A e B, 29% declaram seu interesse nessa atividade, quando sua formação se restringe ao segundo grau.

"Os dados não são conclusivos", adverte João Leiva, responsável pela pesquisa. Não deixarão de ser relevantes, no entanto, quando se procurar formas mais eficientes de estimular o contato da população com o patrimônio artístico.

Não se fazem no vazio, mas integradas ao aprimoramento educacional, as iniciativas de disseminação da cultura. Também não há vida cultural sem suficiente infraestrutura e poder de mobilização, pública ou privada.

Descartadas as formas de dirigismo estatal a que se dedicaram os totalitarismos de esquerda e direita, não resta dúvida de que a disponibilização de equipamentos, locais e ocasiões para o ensino, a criação e o consumo culturais se impõe como política a ser buscada pelo Estado e pelo setor privado.

Vê-se o reflexo da presença de tais estímulos na diferença notada, por exemplo, entre cidades como São José do Rio Preto e Tatuí (respectivamente no campo do teatro e da música de concerto) e a média do Estado no que respeita aos hábitos culturais de seus habitantes.

A demanda existe –e é maior do que se pode imaginar quando não se dispõe de quantificações precisas. A reportagem mostra, ademais, os casos surpreendentes de um porteiro de prédio apreciador de Caravaggio e de uma escritora de 70 anos que se habituou aos downloads da internet.

Sinal de que, para além das estatísticas, o universo da cultura é sempre apropriado individualmente; resta que possa sê-lo por todos.


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