Folha de S. Paulo


PM deve ser proibida de usar bala de borracha? Não

DIÓGENES LUCCA: A POLÍCIA CERCEADA

A pergunta decorre de uma decisão de caráter liminar do Tribunal de Justiça de São Paulo, que proibiu o uso das "balas de borracha" em manifestações populares.

Afirma-se que a Polícia Militar de São Paulo não estava preparada para lidar com protestos, que a corporação age violentamente com a evidente intenção de desestimular as pessoas que querem protestar.

Escuta-se também que a simples posse desse equipamento dá ensejo para que policiais menos preparados atuem com violência desnecessária e que o simples porte desse equipamento intimida aqueles que querem se reunir.

A PM de São Paulo tem se esforçado para se caracterizar não mais como uma polícia defensora do Estado, mas, sim, como defensora da sociedade e a serviço dela.

Ocorre que se trata de um processo de mudança cultural que, por natureza, é lento. É preciso reconhecer, entretanto, o empenho que tem sido feito para formar e treinar o policial no sentido de respeitar todos os aspectos do artigo 5º da Constituição Federal ("todos são iguais perante a lei..."), em particular, os relativos aos direitos humanos.

É fato que houve excessos praticados por ações isoladas de alguns policiais militares, mas a fortíssima crítica que a PM recebeu por causa dessas ações gerou um movimento interno que procurou criar novas formas de ação para se buscar um equilíbrio entre o legítimo direito de protestar e o dever da PM de preservar a ordem pública e garantir a convivência entre as pessoas.

A PM de São Paulo inovou com o "envelopamento", cordão de policiais em volta da manifestação para evitar a dispersão e para proteger os manifestantes contra acidentes, e a "tropa do braço", formada por policiais que fazem a contenção dos manifestantes, por meio de técnicas de imobilização, de alguém que esteja a fim de tumultuar o evento.

As duas técnicas foram desenvolvidas para prevenir acidentes e proteger os manifestantes de criminosos e vândalos que se misturam para depredar o patrimônio público e privado e cometer outros crimes.

Estimulou-se o processo de negociação com as lideranças dos movimentos para colaborar com a manifestação e concitar os participantes a não apoiar aqueles que estão lá por propósitos não republicanos.

Houve muita evolução desde então e hoje é evidente que qualquer manifestação que se queira realizar, não só terá a presença da PM, mas o seu apoio, o que não significa que a instituição deve abrir mão de sua obrigação de manter a ordem pública. Para tanto, a corporação precisa dispor de todos os recursos, em particular, os apropriados para dispersar baderneiros e criminosos.

As munições de borracha são adequadas nestes casos.

Trata-se de um recurso que já está disponibilizado na polícia, seu uso é regulamentado e é muito presente nos cursos de formação e nos treinamentos. É prática adotada em muitos países onde já é consolidado o uso progressivo da força por meio de equipamentos e armamentos de menor potencial lesivo, onde se enquadra o uso de munições de borracha.

O que resta é orientar ainda mais e punir severamente o policial que faz o uso indevido do equipamento, mas jamais rotular a instituição de despreparada e vetar o uso, como determina a liminar.

A decisão, portanto, vem em momento inoportuno, ignora as inúmeras intervenções bem-sucedidas e equilibradas que poderiam ter um desfecho trágico não fosse a eficiência das balas de borracha usadas na justa medida. A decisão é limitante e coloca em risco as pessoas de bem.

Uma coisa é certa: a Polícia Militar não deixará de cumprir seu dever de preservar a ordem pública com os recursos que dispõe.

DIÓGENES LUCCA, 50, tenente coronel da reserva da Polícia Militar de São Paulo, foi um dos fundadores do Gate (Grupo de Ações Táticas Especiais da Polícia Militar). É diretor da consultoria de segurança The First

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