Folha de S. Paulo


Editorial: Colônias da discórdia

Brasil e Israel têm uma semelhança notável. Ambos os países elegem seus parlamentares por meio do voto proporcional puro. No modelo brasileiro, o âmbito é estadual; no israelense, nacional. Em ambos os casos, o sistema favorece a multiplicação de partidos e a criação de bancadas temáticas.

Por aqui, 28 legendas têm assento no Legislativo. Em Israel, são 13, mas há outras 25 agremiações que não conseguiram vencer a cláusula de barreira de 2% dos votos para obter representação no Knesset.

Regras desse tipo ajudam minorias espalhadas pelo território a ter voz no centro do poder, mas por vezes permitem distorções custosas para o país –como as que são vistas em Israel, onde partidos religiosos são super-representados.

No lance mais recente, o primeiro-ministro Binyamin Netanyahu, pressionado por seus parceiros religiosos da coalizão, anunciou planos de construir mais de mil casas para colonos em áreas anexadas de Jerusalém Oriental.

A notícia pode até acalmar Naftali Bennett, ministro da Economia e líder do Partido Lar Judeu, que ameaçava desestabilizar a aliança governista, mas afasta Israel dos países ocidentais com os quais ainda tem boa relação e aumenta a tensão com os palestinos.

A ampliação dos assentamentos, a grande bandeira das legendas religiosas, não se coaduna com uma negociação séria visando pôr fim às hostilidades por uma razão simples: a maioria das colônias se encontra em território que em tese será devolvido aos palestinos.

No caso específico de Jerusalém Oriental, a situação é mais complexa. Israel anexou a região tomada da Jordânia em 1967, mas a comunidade internacional jamais reconheceu esse gesto.

Ainda que os israelenses pretendam negociar um acordo de soberania compartilhada sobre Jerusalém, é necessário ao menos congelar os assentamentos até que as discussões estejam encaminhadas. Agir de outra forma equivale a sabotar o processo de paz.

As colônias, de resto, são criticadas por uma parcela da população pelo montante de recursos públicos envolvido em sua manutenção.

Insistir nessa estratégia só aumentará as queixas do segmento secularista de Israel. Os ultrarreligiosos, beneficiados pelo peso político desproporcional da bancada ortodoxa, ainda preservam outras concessões, como o controle sobre o reconhecimento de casamentos, divórcios e conversões e, em certos casos, até a dispensa do serviço militar obrigatório.


Endereço da página: