Folha de S. Paulo


Antonio José Alves Jr.: O bolso do contribuinte e o financiamento público

Em artigo publicado nesta Folha O BNDES e a queda dos investimentos, 29/9, Luiz F. Figueiredo e Marina Santos, alegaram que o financiamento do investimento com juros baixos pelo BNDES, além de ineficiente, prejudicaria o bolso do contribuinte.

A despeito de lançarem mão de variada argumentação, esqueceram-se de ponderar sobre a maior crise do capitalismo desde 1929 e seus efeitos sobre o Brasil.

Claro que há justificativas para esse esquecimento. As políticas anticíclicas tem reduzido o desemprego, melhorado a distribuição de renda e permitiram que o Brasil saísse do mapa da fome.

Comparando-se com os efeitos perversos no mundo desenvolvido, pode-se pensar que, por aqui, sequer tenha havido crise. Infelizmente, alguns setores dinâmicos e com relevância econômica se ressentem da crise, como parece ser o caso dos bancos privados brasileiros.

Desde a crise europeia, o crédito privado está paralisado e os spreads em alta. Sublinhe-se que esse comportamento, que mina consumo e investimentos, não resultou de maus resultados financeiros dos bancos privados.

A estratégia defensiva, que emergiu de grandes lucros, mimetizou a dos bancos, em sérias dificuldades, dos países desenvolvidos.

Sem base objetiva para esse comportamento, é possível que as expectativas tenham sido tomadas por uma "nostalgia". Um desejo de retorno ao passado, quando cresciam muito sustentados por operações de curto prazo, com spreads elevados, e em ganhos de tesouraria com títulos públicos.

Diante da continuidade da crise internacional, a estratégia de expansão do crédito, em vigor desde 2003, perdeu para a esperança de reencontrar o paraíso.

Especulações a parte, é a ação anticíclica dos bancos públicos que vem respondendo pelo crescimento do crédito para que empresas produzam, invistam e se refinanciem, para que os consumidores adquiriram bens de consumo duráveis.

Beneficiam-se a renda e o emprego, logo, o bolso do contribuinte. Mas até os bancos privados foram aquinhoados, pois o crédito público resultou em inadimplência controlada e nível de liquidez adequado, a despeito dos efeitos em contrário da sua estratégia defensiva.

É indispensável que esse pano de fundo seja estendido ao se avaliar a evolução da carteira do BNDES, que, em valores reais, passou de R$ 300 bilhões, em 2008, para R$ 600 bilhões, em 2013. Estimulou a produção local e a formação de capital, ao tempo que apoiou transformações estruturais, financiando atividades que, mesmo antes da crise, dificilmente teriam amparo junto ao mercado, como infraestrutura, inovação, exportações de alto valor agregado, MPMEs (micro pequenas e médias empresas) e desenvolvimento regional.

Nesse processo, o BNDES buscou a parceria com os agentes financeiros privados. E não apenas nas operações do Cartão, do BNDES Automático e Finame (financiamento de máquinas e equipamentos), em que a parceria foi de R$ 61 bilhões, ou 32% dos desembolsos totais, de R$ 190 bilhões, em 2013.

O Banco explora outros caminhos para parcerias mais sofisticadas, como é o caso do apoio à infraestrutura, seja na participação na oferta pública de pequenas emissões de debêntures, para futura negociação em fundos, seja na construção de operações indiretas.

Em breve, espera-se que empresas possam captar, no mercado, recursos de longo prazo com spreads competitivos. Esse é um caminho para a realização de mais investimentos e de ganhos de produtividade. Porém, enquanto os bancos privados ficarem na defesa, o BNDES e demais bancos públicos precisam continuar assegurando crédito em condições adequadas. Afinal, é preciso emprego e renda para haver contribuintes.

ANTONIO JOSÉ ALVES JR., 49, assessor da presidência do BNDES, é professor de Economia da UFRRJ

*

PARTICIPAÇÃO

Para colaborar, basta enviar e-mail para debates@uol.com.br.

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.


Endereço da página:

Links no texto: