Folha de S. Paulo


Editorial: Separação imprevisível

Segundo pesquisas de opinião, é imprevisível o resultado do plebiscito que decidirá se a Escócia deve ou não se separar do Reino Unido.

Há um mês, dava-se como certa a vitória dos unionistas. Mas a vantagem do "não" sobre o "sim" à independência, que beirou os 20 pontos percentuais, dissolveu-se. Levantamentos recentes apontam empate técnico entre as opções.

Ninguém contava com isso. Em 2012, quando David Cameron, primeiro-ministro britânico, decidiu atender a demanda do Partido Nacional Escocês e realizar a consulta, um possível êxito separatista nem era levado em consideração. Tratava-se apenas de dar uma satisfação a um grupo político.

Cameron imaginava que a medida não teria riscos e traria um benefício claro: a extinção de movimentos em prol de uma Escócia autônoma –utopia presente no imaginário do país desde que a união foi sacramentada, 307 anos atrás.

Talvez esse objetivo até venha a ser atingido, mas a um preço alto. No intuito de desestimular a secessão, o premiê prometeu ampliar os poderes do Parlamento escocês.

O anúncio pode encontrar ouvidos sensíveis entre os nacionalistas, que reclamam dos estreitos limites desse Legislativo, recriado em 1998. Hoje, de fato, o órgão só determina o destino de 7% do que seus cidadãos pagam em impostos.

Para o Reino Unido, é melhor perder os anéis e preservar os dedos. Num eventual divórcio, a Escócia levará um terço do território, 5,3 milhões de pessoas (8% da população) e quase 10% do PIB. Sobretudo, estão em águas escocesas 90% das reservas petrolíferas, estimadas de 16 bilhões a 24 bilhões de barris (o maior campo do pré-sal brasileiro tem 6,5 bilhões).

Também estão em jogo questões menos mensuráveis, embora muito relevantes. A imagem do Reino Unido como potência global sairá ainda mais afetada em caso de separação. O equilíbrio europeu depende da existência de forças que se anulem, e vácuos de poder decerto serão ocupados.

Razões não faltam para o restante do reino se empenhar em conter o impulso nacionalista. Inclusive seria melhor, pelas implicações da decisão, que todos votassem.

Essa, aliás, deveria ser a norma diante de movimentos separatistas, cabendo à população inteira a palavra final –do contrário, a unidade de qualquer país estaria sob constante risco de fragmentação. Exceções à regra sempre poderão ser apontadas em situações de flagrante opressão ou anexação recente e artificial, por exemplo.

Não era o caso da Escócia; mas, tendo aceitado o eleitorado restrito, agora o Reino Unido inteiro espera a escolha dos escoceses.


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