Editorial: Assad avança
Decorridos três anos de guerra civil na Síria, o ditador Bashar al-Assad aos poucos consolida sua supremacia sobre grupos rebeldes.
As sangrentas vitórias no campo da batalha soam como um epitáfio para a Primavera Árabe. E vão impondo, até agora, mais um revés para os interesses norte-americanos na região, em contraste com os de Moscou.
Conforme relatou o enviado especial Diogo Bercito nesta Folha, as forças governistas consolidam o domínio sobre a capital, Damasco. Além disso, retomaram regiões que haviam caído em mãos rebeldes, como a de Homs.
No outro lado da trincheira, a oposição, fragmentada, não consegue articular estratégia comum para enfrentar a ofensiva capitaneada por Assad. De nada ajuda que parte dela seja formada por radicais islâmicos ligados à rede terrorista Al Qaeda.
O avanço de Assad não significa que esteja perto do fim o conflito no qual já pereceram 150 mil pessoas e outros 9 milhões se viram obrigados a abandonar suas casas. A oposição ainda controla parte significativa do território sírio, e as batalhas são diárias, com uma triste rotina de relatos de ataques com armas químicas, atentados em áreas civis e torturas.
No plano diplomático, o fortalecimento de Assad mostra o fracasso da estratégia de Barack Obama para a região. Após ter dito que o emprego de armas químicas representava uma "linha vermelha" que, uma vez cruzada pelo regime do ditador, acarretaria retaliações militares, o presidente norte-americano foi obrigado a recuar. Com uma estratégia astuciosa, Vladimir Putin usou o rechaço internacional a mais uma intervenção militar para blindar seu principal aliado no Oriente Médio.
Com a recente crise na Ucrânia e a anexação da Crimeia (outro sucesso de Moscou, ao menos até aqui), a Síria ficou em segundo plano para as potências ocidentais. Além disso, a questão ucraniana tensionou mais as relações entre Putin e Obama, pelas quais passa a solução do conflito no país árabe.
Outro fator de peso é que o entusiasmo das potências ocidentais pela oposição síria diminuiu muito com a ascensão de grupos islâmicos radicais em suas fileiras. O ímpeto democrático da primeira fase da Primavera Árabe ficou bastante debilitado, fenômeno que não se restringe à Síria -basta ver os recentes desdobramentos no Egito.
Esses fatores internos e externos contribuem para certo pessimismo quanto à Síria. O conflito armado tende a se prolongar, com a iniciativa do lado de um regime ditatorial que vem demonstrando uma violenta e irrefreada determinação para continuar no poder.