O processo participativo de revisão do Plano Diretor Estratégico (PL 688/2013) mostrou a necessidade de alterar a lógica insustentável de desenvolvimento urbano de São Paulo para enfrentar seus grandes desafios: a desigualdade socioterritorial, a carência de habitação para a baixa renda, a (i)mobilidade, a devastação ambiental e a falta de espaços livres que contrabalancem o processo imobiliário. É fundamental que o plano regulamente instrumentos urbanísticos autoaplicáveis para enfrentar esses problemas.
Para aperfeiçoar a proposta, realizamos um processo de escuta, organizado pela Comissão de Política Urbana, Metropolitana e de Meio Ambiente da Câmara Municipal, nos últimos três meses, que envolveu mais de 4.000 cidadãos em 45 audiências públicas. Recebemos quase 900 contribuições e críticas da população, de entidades da sociedade civil, de universidades, de movimentos sociais e de vereadores.
Foi uma experiência fantástica de reconhecimento de cidade, que identificou problemas estruturais, como o conflito pela terra, e questões regionais que mostram uma cidade cada vez mais complexa.
Com essa escuta e com uma análise urbanística, ficou claro que a proposta de concentrar o crescimento e transformação da cidade nos eixos de transporte coletivo de massa e na macroárea de estruturação metropolitana (onde se concentram glebas de grandes dimensões e imóveis subutilizados) é a mais adequada para a cidade, mas exige cuidados na sua regulamentação.
A reestruturação urbana e adensamento dessas áreas ociosas dotadas de infraestrutura poderá conter o especulativo processo de expansão horizontal, que gera segregação socioterritorial, longas distâncias entre a moradia e o trabalho e depredação ambiental.
A articulação entre uso do solo e mobilidade é chave na proposta. Ela exige prioridade para o transporte coletivo, o fortalecimento de modais sustentáveis, como bicicletas, e melhorias para o pedestre, por meio da qualificação do espaço público, calçadas e articulações intermodais.
| Veridiana Scarpelli | ||
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A proposta requer, entretanto, aprimoramentos e regulamentação de instrumentos eficazes, capazes de: a) diferenciar esses "corredores" segundo objetivos urbanísticos e funcionais, ou seja, facilitar o uso residencial no centro expandido e a geração de empregos nas áreas carentes de trabalho; b) viabilizar, por meio de novos mecanismos, a produção massiva de habitação social nessas localizações privilegiadas; c) garantir espaços livres, verdes e de fruição pública que compensem o adensamento; d) preservar o patrimônio urbano, arquitetônico e cultural, garantindo a identidade e memória; e) reforçar o critério já previsto de reduzir a quantidade de garagens; f) reforçar os parâmetros de ocupação de solo que possibilitem o adensamento populacional com menor adensamento construtivo.
O crescimento da cidade "para dentro" exige a reserva de áreas verdes, a recuperação de fundos de vale (áreas de preservação permanente urbanas) na mancha urbanizada e a contenção da expansão horizontal, por meio do estímulo a atividades econômicas sustentáveis na macrozona de proteção ambiental.
O turismo, a agricultura orgânica e outras atividades compatíveis com a preservação devem ser apoiadas, inclusive com o pagamento por serviços ambientais. A articulação entre o Plano Diretor e outros instrumentos ambientais, como a Lei de Mudanças Climáticas e o Plano de Resíduos Sólidos, é indispensável.
Depois dessa escuta pública, nos concentraremos na redação de um substitutivo capaz de aperfeiçoar a proposta, observando as contribuições da sociedade e as avaliações do Legislativo e do Executivo. Não podemos deixar de ser ousados e criativos e de enfrentar os conflitos e interesses que giram em torno da cidade. Só assim vamos equacionar os grandes problemas de São Paulo.
NABIL BONDUKI, 58, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, livre-docente em planejamento urbano, é vereador em São Paulo pelo PT e o relator do projeto de lei de revisão do Plano Diretor Estratégico
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