Com um olho em seu eleitorado e outro nos países vizinhos, Horacio Cartes, 57, do tradicional Partido Colorado, adotou ontem um discurso pragmático ao tomar posse na Presidência do Paraguai.
Embora sem mencionar o Mercosul, declarou sua expectativa de "fortalecimento dos organismos subregionais, regionais e mundiais" e, diante das presidentes do Brasil e da Argentina, afirmou: "Participamos e participaremos destes organismos para consolidar a democracia, fomentar a integração, a cooperação e a vigência dos direitos humanos".
Omitir a palavra "Mercosul" em contexto tão evidente foi um gesto deliberado de Cartes. Trata-se de mostrar brio ao público interno, ainda sensibilizado pela manobra que suspendeu o Paraguai do bloco, há pouco mais de um ano.
Faz parte do mesmo teatro a recusa paraguaia de retornar ao Mercosul enquanto a liderança do grupo couber à Venezuela --o país, não é demais lembrar, ingressou no bloco à revelia de Assunção.
Não devem passar daí, contudo, as mágoas de Cartes. De acordo com o Centro de Análise e Difusão da Economia Paraguaia, cerca de 30% do PIB do país depende das relações com o Mercosul.
Nenhum país poderia dar-se o luxo de abrir mão desse proveitoso comércio internacional --muito menos o Paraguai, onde metade da população é pobre.
Cartes, megaempresário que não desfruta do mesmo apelo popular do ex-presidente Fernando Lugo --afastado do cargo por um impeachment no ano passado--, sabe que precisa aproveitar as "frutíferas relações com os países vizinhos".
O Brasil, de sua parte, fez dois gestos de reconciliação, com a presença de Dilma Rousseff na posse e o anúncio de que voltará em breve a ter embaixador em Assunção --retirado, numa decisão imprópria, em reação à saída de Lugo.
O Brasil também se beneficia das intenções pragmáticas de Cartes. Afora os cerca de 350 mil brasileiros que vivem e trabalham no Paraguai, as complexas relações fronteiriças entre os países e o imbróglio acerca do preço da energia de Itaipu constituem boas razões para manter laços estreitos.
Como se não fossem motivos suficientes, o passado obscuro de Cartes, sobre quem pairam fortes suspeitas de envolvimento em contrabando de cigarros e em lavagem de dinheiro, também recomenda que a condução do país vizinho seja acompanhada de perto.