Folha de S. Paulo


Editorial: Desafios de um conclave

Na qualidade de maior país católico do mundo, o Brasil não tem estado ausente das hipóteses dos comentaristas a respeito da sucessão do papa Bento 16.

Nomes como o de Odilo Scherer, arcebispo de São Paulo, e João Braz de Aviz, antigo arcebispo de Brasília e agora à frente da congregação que cuida das ordens religiosas no Vaticano, constam das listas dos possíveis candidatos --sem, entretanto, surgir entre os favoritos.

Talvez não seja só a quantidade de fiéis (124 milhões --à frente de México, com 93 milhões, Filipinas, com 75,6 milhões, EUA, com 76 milhões, e Itália, com 53 milhões) o que confira importância especial ao Brasil no mundo católico.

Há também o fato de que declina, ano a ano, o número dos que se submetem aos ensinamentos de Roma. O crescimento de denominações evangélicas, assim como o avanço de uma visão de mundo irreligiosa nos grandes centros urbanos, faz do Brasil um campo de disputa, e de convívio, entre dois dos principais desafios enfrentados pelo pontificado de Bento 16.

A saber, o secularismo e o fundamentalismo. Do ponto de vista teórico e doutrinário, Bento 16 sem dúvida procurou responder a essa dupla e contraditória demanda --seja apostando no diálogo com intelectuais agnósticos, seja insistindo no tradicionalismo moral e na rigidez teológica.

A falta de maior carisma pessoal e de uma imagem que simbolizasse a realidade de um catolicismo que é cada vez menos europeu e cada vez mais vinculado a países periféricos certamente dificultou a tarefa de Bento 16 nesse sentido.

Um papa latino-americano, africano ou asiático certamente traria uma mensagem de renovação, ao menos no que tange à imagem de ossificação e rotina que cerca o Vaticano. Não é na origem geográfica de quem ocupará o trono de São Pedro, no entanto, que está o mais importante.

Tanto quanto expressar a nova demografia do catolicismo, o futuro papa terá de enfrentar os problemas de organização interna do Vaticano, sobressaltado por escândalos financeiros e sexuais.

Questões como o diálogo com o islamismo, o judaísmo, o budismo e outras denominações cristãs são mais do que nunca decisivas.

A adaptação da mensagem católica ao mundo moderno, a partir de uma perspectiva mais construtiva e menos condenatória, haveria de ser também um passo significativo para a Igreja Católica --e, sem dúvida, mais digno de comemoração do que a origem, brasileira, africana ou europeia, do sucessor de Bento 16.


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